sexta-feira, 7 de março de 2008

0063) O paranóico (4.6.2003)



O mundo está tomado por um surto de paranóia cultural, e o sintoma mais visível disto são as Teorias da Conspiração que proliferam na imprensa, na literatura, na Internet. 

Você sabia, caro leitor, que nenhum avião explodiu no Pentágono no 11 de setembro? Você já viu os destroços desse avião? Não, porque não existem, foi tudo armação do governo Bush (veja o livro de Thierry Meyssan “The Big Lie”). 

Você sabia que a família Kennedy conhece um segredo que pode desestabilizar a política mundial, e toda vez que ameaça revelá-lo morre um deles? 

Você sabia que a Rússia não libera a Chechênia porque é lá a “Área 51” dos russos, o ponto-de-apoio para naves alienígenas? 

Você sabe quem criou a Aids, e a Sars? 

Você sabia que Paul MacCartney está morto, e que John Lennon está vivo?

Entre no Google ou Yahoo da internet; digite “conspiracy theory” e veja a verdade sobre o assassinato de Lincoln, sobre o incêndio do Reichstag, sobre a maldição das pirâmides, sobre os verdadeiros alvos dos saqueadores dos museus de Bagdá, sobre a verdadeira finalidade do trigo transgênico, sobre a verdadeira finalidade de invenções maquiavélicas como o email e o celular. É uma experiência equivalente ao rompimento dos Sete Selos do Apocalipse.

Brasileiro tem vocação para isso. Nosso personagem-símbolo durante anos foi Ubaldo, o Paranóico, criação do cartunista Henfil. No tempo da ditadura militar, nada podia ser afirmado abertamente, e em consequência tudo era sussurrado às escondidas. 

Tivemos um presidente (Costa e Silva) que sofreu um derrame, ficou inutilizado, e a imprensa não pôde publicar isso. Não admira que tenhamos ficado com um trauma, e que até hoje circulem versões conspiratórias sobre as mortes de Tancredo Neves, Ulisses Guimarães e Marcos Freire.

O paranóico é o cara que de repente exclama: “Eureka! Entendi tudo! Agora, tudo se encaixa! Como não pensei nisso antes?” A gente pergunta: “E o que é?” E vem uma história baseada em fatos reais, conectados entre si de tal modo que revelam a existência de uma conspiração de magos egípcios que pretendem há milênios dominar a humanidade, tendo para isto fomentado a invenção da imprensa, dos óculos bifocais e do intervalo comercial de 30 segundos. 

Não tente discutir com o paranóico: tudo se encaixa. Ele é incapaz de inventar um fato. O que ele faz é criar vínculos vertiginosos: “Todos os presidentes norte-americanos foram maçons, portanto a Guerra do Vietnam e a bomba atômica são consequências das descobertas de Cagliostro, sendo que os romances de Alexandre Dumas e a Lei Áurea são meras cortinas de fumaça, para nos despistar.”

Discutir com um paranóico é inútil: tudo que você argumentar servirá apenas para que ele exclame em triunfo: “Está vendo? Mais uma prova!” 

Vinte anos de ditadura na imprensa me ensinaram a não mangar dos paranóicos. Escuto, pergunto, dou corda. Tenho certeza de que alguém sabe toda a Verdade. Quem me garante que não é um deles?





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