sexta-feira, 7 de março de 2008
0015) Mocinhos e Bandidos (9.4.2003)
Numa pesquisa recente, perguntou-se a um grupo de jovens se, num filme, prefeririam ser os mocinhos ou os bandidos; 92% afirmaram que queriam ser bandidos.
Pra mim, o rigor científico dessas pesquisas mede-se em zero-vírgula, mas, mesmo aceitando a premissa, não posso deixar de pensar que, se esses garotos voltarem a ser entrevistados daqui a 20 anos, duvido que 92% tenham de fato se transformado em bandidos. Provavelmente serão comerciários, biscateiros, mecânicos, músicos, operários, seja lá o que fôr, menos bandidos.
O que acontece é que eles gostariam de ser bandidos, porque ser bandido parece mais excitante e mais desafiador do que ser mocinho. Os mocinhos em geral são bonzinhos demais, politicamente corretos demais, chegam a parecer meio abestalhados.
Os jovens, em casa e na escola, vivem submetidos a uma lavagem cerebral em louvor do Bem (por pessoas que muitas vezes fazem o contrário do que pregam). Vai daí que acabam sendo atraídos pelo ícone do Mal, o Vilão, que faz o que lhe dá na telha, aparenta ter muito mais liberdade, mais força de vontade e mais personalidade do que o herói.
O mocinho das histórias edificantes e dos livros didáticos parece o “bom menino” da música do palhaço Carequinha: não faz isto, não faz aquilo, não pode isto, não pode aquilo... É sempre definido pelo que lhe proíbem fazer.
Comparado à vida deste impossível modelo de obediência, a vida de um bad boy é um festival de liberdade, de aventura, de auto-afirmação.
Isaac Asimov, comentando o fascínio exercido pelos vilões da literatura e do cinema, fazia a comparação destes com o Deus e o Diabo criados pelo poeta Milton em seu “Paraíso Perdido” (1667):
“O Satã de Milton é indomável em sua derrota, tem gestos momentâneos de piedade, e é por isso que é um personagem interessante; já o Deus de Milton nunca tem a chance de ser algo menos que perfeito, e é por isso que é tão aborrecido.”
Muitas vezes um jovem atraído pelo Mal não busca de fato o Mal. Busca a sensação de liberdade, de afirmação, de desafio, que às vezes lhe é negada por uma imagem do Bem onde tudo que ele pode fazer é se comportar, não incomodar os adultos, e obedecer calado às instruções das autoridades.
Os educadores do Futuro (porque o Presente, pelo andar da carruagem, já foi despenhadeiro abaixo) deveriam mostrar logo aos jovens que fazer o Bem é mais aventuroso, mais divertido, mais desafiador, mais difícil, mais assustador e mais misterioso do que fazer o Mal.
Não é preciso falar nas recompensas de fazer o Bem (o Paraíso, a Vida Eterna, etc.), porque esse tipo de suborno moral, pelo que vejo ao meu redor, não tem interessando a muitos jovens.
Bastaria explicar a eles o óbvio: que destruir e incendiar qualquer bundão destrói e incendeia, mas que inventar coisas boas, cultivar coisas boas, fazer coisas boas funcionarem é só pra quem pode.
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