Certa vez eu estava com uns americanos, conversando sobre ficção científica, e por algum motivo começamos a falar sobre xadrez. Um deles perguntou: “And you, Braulio, do you play chess?...” Ao que eu respondi: “Badly and pigly.” Eles não sabem o que é “mal e porcamente” em português, mas riram assim mesmo.
E na verdade jogo xadrez mal e porcamente, do mesmo jeito que falo inglês. Jogo de olho, e falo de ouvido. Algumas pessoas me mostraram o básico, e daí em fui em frente, na base da intuição, da memória, e do prazer de tentar uma coisa sem saber se vai dar certo. Não tenho a preocupação de acertar sempre. Quando erro, tento descobrir como teria sido o certo, anoto, e sigo em frente.
O xadrez é a mais velha metáfora da vida. Na infância, decorei um verso de Omar Khayam nos seus “Rubayat”:
Inermes peças nós, no jogo que Ele joga
no da Noite e do Dia enorme tabuleiro.
Ora nos move ou prende, nos retém, nos solta,
e depois, um a um, à caixa faz voltar.
Jorge Luís Borges evocou noutro poema essa imagem do tabuleiro como o conjunto dos dias e das noites; e Bob Dylan ironizou numa canção o assassino de um líder negro do Mississippi dizendo: “He´s only a pawn in their game.”
Para mim, no entanto, o xadrez é metáfora para tudo. Para a literatura, o futebol, a política, a vida amorosa.
Uma das primeiras coisas interessantes que aprendi no xadrez foi: “Nunca mova uma peça tendo apenas um objetivo em mente.” É perda de tempo, desperdício de munição.
Um bom movimento serve para, por exemplo:
a) ameaçar uma peça inimiga;
b) abrir espaço para que uma peça sua possa se deslocar daqui a pouco;
c) desviar a atenção do adversário para o flanco esquerdo, porque você está preparando mesmo é uma investida pela direita;
d) impedir que o adversário mova uma peça que pretendia mover, pois se movê-la estará se auto-colocando em xeque;
e) ameaçar uma casa que o adversário precisaria ocupar mais tarde, na linha de ação que vinha seguindo; e assim por diante.
Pense numa coisa parecida com poesia! Muitas vezes um trecho de um poema serve para:
a) preparar uma rima obrigatória que virá a seguir;
b) criar, no interior do verso, um contraste rítmico com algo que vem antes, ou depois;
c) retomar uma imagem visual sugerida no começo do poema, e agora revista por outro ângulo;
d) usar uma palavra com forte referência cultural específica (uma citação, uma gíria, um arcaísmo, um termo erudito, etc.); e assim por diante.
Os manuais de roteiro cinematográfico ensinam que toda cena deve servir para uma destas três coisas, melhor ainda se forem as três:
1) avançar a ação;
2) aprofundar o personagem;
3) ilustrar a idéia.
O presente artigo, por exemplo, complementa uma idéia sugerida no de 8 de abril (sobre decisões estratégicas), reforça uma proposta feita em 26 de abril (atividades mentais simultâneas), e amplia a psicologia do jogador comentada em 13 de maio. A longo prazo, vocês vão ver como tudo se encaixa.
E na verdade jogo xadrez mal e porcamente, do mesmo jeito que falo inglês. Jogo de olho, e falo de ouvido. Algumas pessoas me mostraram o básico, e daí em fui em frente, na base da intuição, da memória, e do prazer de tentar uma coisa sem saber se vai dar certo. Não tenho a preocupação de acertar sempre. Quando erro, tento descobrir como teria sido o certo, anoto, e sigo em frente.
O xadrez é a mais velha metáfora da vida. Na infância, decorei um verso de Omar Khayam nos seus “Rubayat”:
Inermes peças nós, no jogo que Ele joga
no da Noite e do Dia enorme tabuleiro.
Ora nos move ou prende, nos retém, nos solta,
e depois, um a um, à caixa faz voltar.
Jorge Luís Borges evocou noutro poema essa imagem do tabuleiro como o conjunto dos dias e das noites; e Bob Dylan ironizou numa canção o assassino de um líder negro do Mississippi dizendo: “He´s only a pawn in their game.”
Para mim, no entanto, o xadrez é metáfora para tudo. Para a literatura, o futebol, a política, a vida amorosa.
Uma das primeiras coisas interessantes que aprendi no xadrez foi: “Nunca mova uma peça tendo apenas um objetivo em mente.” É perda de tempo, desperdício de munição.
Um bom movimento serve para, por exemplo:
a) ameaçar uma peça inimiga;
b) abrir espaço para que uma peça sua possa se deslocar daqui a pouco;
c) desviar a atenção do adversário para o flanco esquerdo, porque você está preparando mesmo é uma investida pela direita;
d) impedir que o adversário mova uma peça que pretendia mover, pois se movê-la estará se auto-colocando em xeque;
e) ameaçar uma casa que o adversário precisaria ocupar mais tarde, na linha de ação que vinha seguindo; e assim por diante.
Pense numa coisa parecida com poesia! Muitas vezes um trecho de um poema serve para:
a) preparar uma rima obrigatória que virá a seguir;
b) criar, no interior do verso, um contraste rítmico com algo que vem antes, ou depois;
c) retomar uma imagem visual sugerida no começo do poema, e agora revista por outro ângulo;
d) usar uma palavra com forte referência cultural específica (uma citação, uma gíria, um arcaísmo, um termo erudito, etc.); e assim por diante.
Os manuais de roteiro cinematográfico ensinam que toda cena deve servir para uma destas três coisas, melhor ainda se forem as três:
1) avançar a ação;
2) aprofundar o personagem;
3) ilustrar a idéia.
O presente artigo, por exemplo, complementa uma idéia sugerida no de 8 de abril (sobre decisões estratégicas), reforça uma proposta feita em 26 de abril (atividades mentais simultâneas), e amplia a psicologia do jogador comentada em 13 de maio. A longo prazo, vocês vão ver como tudo se encaixa.
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