Dias atrás tive uma experiência que me deu calafrios. Saí de casa para ver o filme Deus é brasileiro, que segundo o jornal estava em exibição no Cine Largo do Machado, numa agradável galeria que frequento há vinte anos. Ao entrar na galeria, olhei de longe e tive um susto, pois no quadro fluorescente onde está anunciado o título do filme estava escrito: “Igreja Universal do Reino de Deus”. Não era alucinação: o cinema tinha sido comprado na véspera, e agora, em vez do filme de Cacá Diegues, estava rolando um culto.
Deus é brasileiro? A Igreja Universal, do bispo Edir Macedo, foi criada no Rio de Janeiro em 1977, e já foi apontada como a religião que mais cresceu no mundo inteiro nos últimos 25 anos. Ficou conhecida pelos mega-eventos que promove, colocando 200 mil pessoas no Maracanã para um dia inteiro de preces e arrecadação de donativos. Está presente hoje em todos os continentes. Só na Califórnia (EUA) são 26 templos, atraindo principalmente a população “chicana” local. Está na Rússia desde 1997, na Itália e na Suíça desde 1993; são milhares de templos, sendo mais de 300 fora do Brasil, e milhões de fiéis. Os fiéis atribuem à IURD tudo que de bom aconteceu em suas vidas. Os seus críticos (como os críticos da maioria das igrejas) dizem que é uma empresa capitalista como qualquer outra, e de caráter lotérico: cobra pouco, promete muito, e você só sabe se ganhou ou não depois que morre.
Tenho observado uma diferença interessante entre as religiões da Antiguidade e as contemporâneas. No mundo antigo, as religiões se expandiam militarmente, através de exércitos de soldados possuídos pelo fervor da fé. “Deus o quer!” era o grito dos cruzados que partiam para libertar o Santo Sepulcro, “desbaratando o Turco, o Sarraceno e o Mouro”, como dizia Bilac. Se Deus queria, era lícito passar a fio de espada quem se atravessasse no caminho. É famosa a história do Abade de Citeaux, que ao invadir um reduto onde cristãos se misturavam aos hereges Cátaros, ordenou: “Matem todos; Deus saberá quem são os seus.” Já vi esta mesma história ser atribuída a um muçulmano. Faz diferença?
Em vista disto, muita gente perdoa as religiões que se expandem ao estilo das franquias de fast-food e das redes de vendas de bugigangas, tipo Amway. Pode ser que arrancar tostões de quem ganha um salário mínimo seja um processo meio brabo de acumulação de capital, mas pior ainda é queimar gente na fogueira e saquear cidades. Por outro lado, supondo que Deus exista, tudo fica claro de repente. Deus está querendo nos dizer que, sendo verdadeira a mensagem, não importa quem seja o mensageiro. Se um médico falso lhe dá um remédio verdadeiro, você fica bom do mesmo jeito. Deus está como um relojoeiro, com uma lupa aplicada ao olho, vigiando e monitorando a alma e as intenções de cada um – pastores e ovelhas. Se no mundo de fato um Deus existe, ele sabe entre nós quem são os seus.
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