quinta-feira, 19 de julho de 2012

2927) Clone de heavy-metal (19.7.2012)






A briga entre o digital e o analógico não avança sem alguns golpes baixos.  Ou algumas boas malandragens, de acordo com o ponto de vista.  Boa malandragem parece ser o ponto de vista de banda de heavy metal Def Leppard, cujo trabalho conheço pouco mas me lembro de ter visto no Rock in Rio de 1985.  O Leppard parece estar vivendo uma profunda crise conjugal com sua gravadora, a Universal Music. (O relacionamento entre gravadoras e artistas contém alguns padrões que lembram muito o relacionamento entre maridos e esposas.)  Os dois não têm chegado a um acordo sobre a remuneração mais justa sobre vendas e downloads de faixas do catálogo da banda.  A discussão chegou a um ponto em que deixou de haver discussão.

“Nosso contrato”, diz o líder Joe Elliott, “estabelece que eles não podem fazer nada com as músicas sem a nossa permissão, absolutamente nada.  Então nós mandamos uma carta dizendo: Não importa o que vocês sugerirem, vão ter um ‘não’ como resposta, então é melhor não sugerirem nada”.  O problema é que a Universal também detém direitos sobre os fonogramas gravados pela banda, em seus 30 anos de carreira.  Como sair do impasse?

Simples: a banda está regravando em estúdio seus grandes sucessos, reproduzindo a gravação original com a mesmíssima sonoridade, mas gerando com isso um novo fonograma que pertencerá somente a ela.  Um auto-plágio ou auto-falsificação? Diz Elliott que é um trabalho duro: “Tivemos que estudar essas canções nos mínimos detalhes, e fazer imitações perfeitas. Deve ter levado o mesmo tempo de gravação que as faixas originais, mas por causa das novas técnicas o processo final foi mais rápido. Mas, como recapturar aquelas sonoridades?  E onde eu vou achar aquela voz com 22 anos de idade?”.

Por causa da briga, o Def Leppard é uma das poucas super-bandas cujo catálogo ainda não é disponível para downloads; duas destas regravações estão iniciando este processo. A nova “Pour Some Sugar On Me” já vendeu 21 mil downloads nos EUA e “Rock of Ages” mais de 5 mil. Qualquer músico profissional sabe que reproduzir com perfeição uma faixa já gravada é geralmente muito mais difícil do que simplesmente regravá-la “de um jeito parecido”, sem se preocupar em obter semelhança total.  A auto-regravação parece uma “solução de português”, mas ela revela pelo menos o grau de irreversibilidade nas relações da banda com a gravadora.  Os músicos acham que esse trabalho insano, e aparentemente desnecessário, é melhor do que voltar a discutir a utilização dos fonogramas antigos.  Não é por nada não, mas bem que João Gilberto poderia fazer a mesma coisa, com muito mais facilidade.