quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

3090) A poesia e a ciência (23.1.2013)





(Martins Jr.)


Ainda com relação à palestra recente de Ariano Suassuna sobre Augusto dos Anjos, na Paraíba: Ariano fez uma menção à “Escola do Recife”, que teve um papel importante na formação do poeta do Eu. A Escola do Recife foi um movimento nacionalista e cientificista do final do século 19, concentrado na Faculdade de Direito do Recife, que reuniu intelectuais como Tobias Barreto, Joaquim Nabuco, Sílvio Romero e muitos outros. Entre os ativistas do movimento junto à Faculdade estava Martins Júnior (José Isidoro Martins Jr.), intelectual e poeta, grande leitor de ciência e de filosofia, que publicou em 1883 um ensaio intitulado A Poesia Científica. (Ver trechos aqui, em sua página na Academia Brasileira de Letras: http://bit.ly/UoGGcz).

Há influência de Martins Jr. (1860-1904) sobre a obra de Augusto. Os dois têm muito a ver em estilo, em assunto, em visão do mundo. Na sua palestra, Ariano fez uma distinção entre o talento e o gênio. Disse ele que as teorias poéticas de Martins Júnior eram brilhantes, mas que sua poesia era fraca, porque ele tinha apenas talento.  Já Augusto, segundo Ariano, tinha gênio; foi ele quem produziu a “poesia científica” que Martins Júnior teorizou e não foi capaz de criar.

R. Magalhães Jr., em sua Poesia e Vida de Augusto dos Anjos, comenta no capítulo 11 que a morte inesperada de Martins Jr., aos 44 anos, ocorreu em agosto de 1904, causando grande comoção no Recife e na Faculdade de Direito, onde Augusto já estudava. Ele registra a influência, em Martins Jr., “do evolucionismo spenceriano, do transformismo darwínico, do monismo haeckelista e do realismo científico materialista”. Ou seja, praticamente a base filosófica de onde decolava a poesia de Augusto. 

Magalhães transcreve uma estrofe de um poema de Martins Jr., onde se pode ver a tentativa de algo que Augusto, mesmo bem mais jovem, realizaria de maneira mais madura, logo a seguir: “Como coisas senis, fossilizadas, negras, / amontoam-se além as bolorentas regras / da Bíblia, do Alcorão, do Avesta e Rig-Veda. / Trôpegos, sem valor, curvos, de queda em queda, / fogem, na treva espessa, Adon, Moloque, Siva, / Ormud, Vichnu, Ahriman, Baalath...”  Augusto também evocaria muitos desses nomes místicos.

Martins Jr. defendia uma poesia que incluísse “desde a lei astronômica da atração até o evolucionismo biológico e social”. Dizendo-se discípulo de Baudelaire e de Guerra Junqueiro, criticava a poesia de sua época, a que chamava “poesia chorona”. E afirmava: “Denomino a poesia, a fórmula poética do futuro, como eu a compreendo e como eu a quero, deste modo – cientificismo filosófico, ou poesia científico-filosófica”.