sábado, 22 de agosto de 2015

3900) Meu artigo 4.000 (23.8.2015)





Duvido que mesmo muitos fãs da literatura policial, hoje em dia, conheçam o modesto Edward D. Hoch, autor norte-americano falecido em 2008 aos 77 anos. Escreveu poucos romances (inclusive três de ficção científica). A maior parte de sua produção foi em forma de contos. Hoch (pronuncia-se “Rôuk”) foi um típico escritor da ficção popular dos EUA. Às vezes somos tentados a chamar toda essa literatura-de-gênero de “pulp fiction”, mas existe uma grande diferença de formato e de estilo entre a pulp fiction propriamente dita (que floresceu nas décadas de 1920-30-40) e a ficção das revistas dos anos 1950 em diante, as chamadas revistas “digest”, de tamanho menor, com menos ênfase do que as “pulp” no melodrama e no sensacionalismo, histórias em média mais bem escritas e mais curtas. O modelo mais conhecido do leitor brasileiro é o saudoso Mistério Magazine de Ellery Queen.

Um diferencial de Hoch é a variedade de detetives que criou. Suas histórias são formulaicas, ou seja, cada uma delas repete obrigatoriamente um certo número de efeitos e até mesmo uma estrutura fixa, onde variam os elementos. Isto é típico da ficção popular, escrita em quantidade, e na qual seria contraproducente ter que reinventar tudo do zero em cada nova narrativa. As enciclopédias detetivescas listam entre 20 e 30 detetives inventados por ele, vários com dezenas de histórias.

Meus preferidos são o Dr. Sam Hawthorne, um médico da Nova Inglaterra que resolve crimes impossíveis (quarto fechado, etc.); Rand, um espião inglês cuja especialidade é decifrar códigos secretos (os mais implausívelmente barrocos!) usados por espiões inimigos; e Nick Velvet, um ladrão profissional que se especializa em roubar para seus clientes objetos aparentemente sem valor ou sem motivo aparente (a água de uma piscina, p. ex.).

Hoch é considerado o contista mais prolífico do mundo literário, com cerca de 940 contos publicados. Em maio de 1973 ele iniciou uma série que dificilmente será igualada: todos os meses uma nova história sua apareceu na edição norte-americana do Mistério Magazine de Ellery Queen, e isto se manteve por 34 anos ininterruptos.

Este meu artigo de hoje no Jornal da Paraíba poderia ser dedicado aos escritores que mais admiro: Borges, Guimarães Rosa, Machado, Joyce, Kafka... Mas este é o meu artigo 4.000 desde que iniciei esta coluna em março de 2003, sem faltar um dia sequer.  Prefiro render homenagem a um obscuro profissional da máquina de escrever, que, mais do que qualquer gênio da literatura, me deu o mais importante dos exemplos. Ser escritor é tornar-se capaz de escrever todos os dias. Ergo uma cerveja, portanto, em honra de Edward D. Hoch.