terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

3107) O nome da fera (12.2.2013)





Dias atrás mais uma tempestade de inverno atingiu os Estados Unidos. A imprensa a chamou de Nemo. Um nome aparentemente adequado, por ter ressonâncias marítimas: o capitão Nemo de 20 Mil Léguas Submarinas, o peixinho de Procurando Nemo.  Muita gente, porém, reclamou desse nome, porque ao que parece não é costume dar nome a tempestades de inverno. É uma dessas tecnicalidades divertidas do mundo da burocracia científica.

Segundo o saite Terra, “apesar de a tempestade estar sendo chamada de Nemo por vários veículos da mídia americana, o nome não é oficial, mas sim uma criação da emissora Weather Channel, o que gerou uma polêmica nas mídias sociais e entre alguns jornalistas. ‘Nós não estamos usando esse nome arbitrário para a tempestade’, disse Jason Samenow, do Washington Post; ‘é sem sentido’. Oficialmente, o Serviço Nacional de Meteorologia dos Estados Unidos dá nome a apenas tempestades tropicais e a furacões. Tempestades de inverno não costumam receber alcunhas, mas o Weather Channel passou a adotar identificações para ajudar a alertar os moradores de áreas atingidas e torná-las mais fácil de serem seguidas, especialmente nas redes sociais”.

Os meteorólogos devem ter lá suas razões para batizar umas coisas e não batizar outras. Na verdade, o sistema de nomeação dos furacões tem uma lógica: nomes próprios por ordem alfabética, para que seja mais fácil situar um furacão em relação a outro. (Escrevi a respeito aqui: http://bit.ly/Y12qK0). E damos nomes às coisas pelos mesmos motivos por que damos nomes a nós mesmos. Imaginem só o problema se nosso amigo José não se chamasse José; teríamos que ter dezenas de designações diferentes para ele: o filho de Seu Zuca, o filho de Dona Maria, o irmão de Joana, o menino da casa da esquina, o menino que tem um cachorro marrom... Um nome enfeixa isto tudo numa fórmula curta e sólida.

Pelo mesmo motivo inventamos nomes como amor, liberdade, democracia, ética, etc. Não correspondem a criaturas reais. Se nos pedissem uma definição para qualquer um desses conceitos teríamos dificuldade em fornecê-la, e mesmo que o conseguíssemos dificilmente seriam encontradas duas definições iguais. O nome serve por um lado para tornar nítida uma coisa difusa e por outro lado para sugerir que várias coisas são uma só por serem chamadas pelo mesmo nome. Sempre que dizemos “o Brasil” estamos nos referindo, em princípio, a uma entidade geograficamente, historicamente e politicamente concreta; e também a um fenômeno tão heterogêneo, tumultuado, contraditório, instável e mutante quanto uma tempestade tropical. Ou de inverno.