quarta-feira, 30 de março de 2011

2517) A epifania da mente (30.3.2011)



A mente humana funciona a pleno vapor no período do nascimento até os três ou quatro anos. Nessa época aprendemos a pensar, aprendemos a ver e a ouvir, aprendemos a entender, aprendemos a aprender. Adquirimos o conhecimento sensorial das coisas em volta e do nosso próprio corpo; adquirimos controle motor sobre nossos órgãos e membros; adquirimos a linguagem, a socialização, a distinção entre imaginação e realidade. Aprendemos o nomes e as funções de cada objeto ou pessoa, e ao mesmo tempo aprendemos que tipo de comportamento cada uma delas espera ou exige de nós. Depois dessa época, amigos, paramos de aprender. Vivemos no piloto automático, correndo atrás quando a barra pesa, tocando a bola no meio de campo quando o placar é favorável. Mas paramos de pensar.

Talvez seja isto o que distingue os cientistas e os artistas: são pessoas que não pararam de pensar. Claro que há exceções para tudo, mas a ciência e a arte são atividades em que se espera do sujeito que tenha idéias novas, idéias únicas e pessoais. Num certo sentido, são obrigados a permanecerem crianças a vida toda, ou a manter uma banda de sua cabeça pensando como criança. Vendo as coisas como se fosse pela primeira vez.

Às vezes o cientista vê algo que só está ali virtualmente. Galileu estava um dia olhando uma carruagem que passava devagar e imaginou um pingo de lama caindo no aro de uma das rodas da carruagem. Imaginou que à medida que a roda rodava o pingo de lama descrevia um círculo, mas como a carruagem avançava horizontalmente o traçado desse círculo avançava também: surgiu daí a ciclóide. Esta curvazinha invocada já tirou pontos de muitos vestibulandos que não tiveram o prazer de descobri-la por si mesmos e sentirem-se Deus por um segundo.

Conta-se também (Zsolt Harsaniy, A Vida de Galileu) que ele quando jovem foi desprezado por uma namorada e decidiu se matar, jogando-se ao rio. Debruçou na ponte e ficou vendo as coisas que passavam na correnteza. A flutuação de alguns objetos começou a lhe parecer diferente da flutuação de outros, e, como o marinheiro na “Descida ao Maelstrom” de Edgar Poe, ele percebeu uma lei matemática naquilo. Mandou a namorada pastar e correu pra casa para fazer os cálculos.

Alejandro Jodorowsky, numa entrevista à revista carioca Azougue, contou este episódio: “Darei um exemplo do que faz a poesia. Eu estava nessa época no Chile, era um adolescente, um garoto de uns 20 anos e era muito amigo de um psicanalista. E um dia ele me disse que acabara de passar algo incrível, porque, ele disse, você sabe que um trauma é algo desagradável, mas tenho um caso de alguém que se tornou louco devido a um pensamento poético que teve. Há um rio em Santiago, o Mapocho, e no poente ele se pôs a observar o rio. As águas do rio passam, passam... o reflexo das estrelas permanece. Ficou louco. Isso se deu porque era uma pessoa comum. O primeiro pensamento poético que teve tornou-o louco”.