terça-feira, 31 de julho de 2018

4372) Eu vou pra lua (31.7.2018)




Todo o alvoroço em torno da Lua Cor de Sangue de dias atrás rendeu belas fotos, infográficos, animações, imagens sequenciais, gifs e o escambau, um ou outro texto calhou de lembrar as chegadas do homem à Lua no cinema. Eu fiquei me lembrando que também a Música Popular Brasileira deu umas triscadas nesse tema.

No meu tempo de infância o galã Francisco Carlos estrelava filmes marcantes como Colégio de Brotos (Carlos Manga, 1956), tinha uma bela voz, e lhe coube em 1962 cantar essa marchinha, que se outra virtude não possui tem a de estar colhendo no ar o melhor mote do momento.



A Lua e a Colombina

Mas eu vou pra Lua, se Deus quiser,
mas se puder, levar mulher. (2x)

Colombo foi ao Novo Mundo
e o Velho Mundo se espantou;
Gagárin foi ao céu profundo,
voou, voou, voou...
Eu também quero ir à Lua
pra ver a Terra toda azul...
Quero ser o Colombo dos espaços
levando Colombina nos meus braços...


É curioso que já numa marchinha do Carnaval carioca circule essa comparação da chegada à Lua com a Descoberta da América. A homenagem carioca é ao russo Gagárin, quando este tornou-se o primeiro homem a sobreviver publicamente na órbita da Terra.

Gagárin não foi à Lua; coube a três norte-americanos chegarem lá, sete anos depois.

Antes de todos, para mim, foi Ary Lobo, esta grande voz esquecida do nosso cancioneiro. Muitos o conhecem como o paraense que também gravou o clássico “Súplica Cearense” de Gordurinha. Gravou sambas memoráveis, cocos, baiões. Pertenceu à geração seguinte à de Jackson do Pandeiro.



Tinha um olho vivo, esperto, de sambista pegando passarinho no ar, olho que está em “Eu Vou Pra Lua” (1960), canção de Luiz de França, que ele celebrizou:

Eu vou pra Lua, eu vou morar lá...
Vou no meu Sputnik, do campo do Jiquiá.

Os versos desta música são daquele tipo renovável a cada geração política que se sucede no país; como tantos sambas de breque, como tantas emboladas satíricas, da crônica malandra dos costumes. O samba é imortal porque os personagens nunca saem de cena.

Essa letra é uma Utopia autocontraditória, cheia de personalismos – como convém ao gênero. A Utopia é um gênero literário onde se ilustra a tese de que é possível resolver os problemas do mundo sem gerar nenhum problema novo.

Nem vou falar no machismo sobre os dez anos de cadeia para a mulher; mas há um certo calafrio numa utopia que diz que “não tem juventude transviada” (aí creio que inclui de James Dean a Raul Seixas) e que “morre na rua quem faz anarquia” – como quem define o que é anarquia é o mesmo que está com a arma na mão, morre-se então por qualquer coisa.

Uma utopia totalitária, portanto. O que talvez seja até um pleonasmo.

Em todo caso, a canção é ótima, é uma canção que marcou toda uma geração de letristas e parceiros; aqui está Tadeu Mathias, no show dos “30 Anos do Baque Solto”, de Lenine e Lula Queiroga.


O sucesso dessa gravação deve ter sido grande, porque logo depois (era a época dos discos em 78 rotações, lançavam-se singles de acordo com o sopro do vento), Ary Lobo desembarcou no mercado com “Quando Eu Cheguei na Lua” (1961), uma espécie de “resposta” à primeira canção.



Quando eu cheguei na Lua, foi grande a recepção...
Fui entrevistado, falei na televisão.


O sujeito saiu no Sputnik e chegando lá na Lua se deparou com a sua Utopia de brasileiro safo. Só não imaginava é que ao chegar no Paraíso iam lhe pedir contas do Brasil que deixou para trás. E a segunda canção ainda critica a Terra, mas inclui nessa crítica o Narrador, brasileiro “ixperto” que é desmascarado por esses selenitas invisíveis.

A canção volta a bater nas teclas da burocracia e corrupção, da fome e carestia, da moralidade feminina. Cada uma das três estrofes tem sua correspondente na canção original.

O projeto espacial russo produzia imagens mais vívidas do que o norte-americano. A cadela Laika, que morreu para nos levar aos céus. O cosmonauta anunciando que a Terra é azul. A primeira mulher. Todo mês tinha uma grande novidade nas manchetes. Alguém poderia se dar o trabalho de peneirar todas as canções desse período que usaram esse mote; “Lunik 9” de Gilberto Gil é talvez a melhor delas.









sábado, 28 de julho de 2018

4371) Os bilionários e o Fim do Mundo (28.7.2018)




Se você soubesse, com certeza bastante concreta, que o mundo ia se acabar (conflito nuclear, ou catástrofe ambiental, ou meteoro, etc.), o que você faria – se tivesse um bilhão de dólares pra investir?

Vocês eu não sei. Mas eu procuraria um lugar relativamente afastado e seguro (montanha, espaço subterrâneo, etc.) e usaria meu bilhão para construir ali um abrigo onde eu, minha família e alguns amigos pudéssemos ficar em segurança. Durante algumas décadas. Preparando-nos para sair dali um dia... e repovoar a Terra.

É um sonho antigo da humanidade (Arca de Noé, etc.). A versão atual é um sonho recente. Começou durante a Guerra Fria, com a possibilidade do extermínio nuclear.

Me vem à mente a sequência final do Dr. Fantástico de Stanley Kubrick – os generais norte-americanos (com George C. Scott à frente) ficam entusiasmados com a sugestão do dr. Fantástico (Peter Sellers):

DR. FANTÁSTICO
Sr. Presidente, eu não descartaria a possibilidade de preservarmos um núcleo da espécie humana no fundo das nossas mais profundas galerias de mineração. (...) Reatores nucleares poderiam fornecer energia por um tempo indefinido. Vegetais poderiam produzidos em estufas. Animais poderiam ser criados e abatidos. Poderíamos fornecer instalações adequadas para algumas centenas de milhares de pessoas.

PRESIDENTE MUFFLEY
Eu detestaria ter que decidir quem ficaria por cima e quem entraria no buraco.

DR. FANTÁSTICO
Poderemos programar um computador com parâmetros de juventude, saúde, fertilidade sexual, inteligência, e uma variedade de qualificações técnicas. Seria absolutamente vital, é claro, que nossas lideranças políticas e militares fossem incluídas, para poderem preservar e transmitir os nossos princípios de tradição e de liderança.

Parece improvável? Pode até ser, mas eu vi esse filme com 17 anos e desde então essa hipótese nunca foi afastada da minha mente. Dou até hoje como favas-contadas o fato de que é exatamente isso uma das coisas que o Pentágono e seus satélites vêm fazendo desde então. Continua plausível. Porque é mais ou menos o que eu faria, se estivesse no lugar deles.

De lá pra cá, meio século se passou. Serei otimista a ponto de imaginar que essas “lideranças políticas e militares” estão dando-de-barato que o mundo não vai ter problemas? Acho que não.



Nem vou falar em guerra nuclear. É uma possibilidade um tanto mais remota, agora que a Rússia conseguiu instalar o seu “Mandchurian Candidate”, Donald Trump, na Casa Branca.

Mas a situação se agrava em outras frentes. Li há pouco no websaite do Terra esta matéria sobre recursos naturais do planeta:

No próximo dia 1º de agosto, a população mundial terá consumido todos os recursos naturais - frutas, verduras, carnes, peixes, água, madeira e etc. - disponíveis para 2018 e começará a retirar do planeta mais do que ele pode oferecer.

Essa data é chamada de "Earth Overshoot Day", ou, em português, Dia da Sobrecarga da Terra, e é calculada anualmente pela organização internacional Global Footprint Network - em 2017, a população esgotou os recursos do planeta para aquele ano em 2 de agosto.

Segundo a entidade, para satisfazer as necessidades de recursos naturais da população global seria preciso ter uma Terra e mais 70% de outra. O ser humano passou a consumir acima da capacidade de regeneração da natureza na década de 1970, e, desde então, o Dia da Sobrecarga acontece cada vez mais cedo.

No entanto, a exploração não se dá de forma equilibrada por todo o planeta: se todos vivessem como os habitantes dos Estados Unidos, por exemplo, seriam necessárias cinco Terras; se tivessem o mesmo padrão de consumo dos indianos, por outro lado, 0,7 Terra já seria o bastante.

Link:

E enquanto isto, os Muito Ricos estão preparando suas futuras Zonas de Conforto.

O websaite da CNN publicou ano passado a matéria de Elizabeth Stamp intitulada Os bunkers dos bilionários: como os 1% estão se preparando para o Apocalipse.

Aqui a matéria completa (com galeria de fotos):

O texto explica que os bunkers de proteção antinuclear dos anos 1950 eram porões de cimento cheios de comida enlatada e água mineral. A boa notícia é que os bunkers de hoje deixam no chinelo algumas suítes presidenciais de Dubai. Quem tem dinheiro pesado investe pesadamente no próprio futuro, e tem que ser um futuro que não deixe saudades do presente.

Aconselho uma olhada na galeria de imagens destes saites. Algumas parecem estar ao ar livre, mas os bunkers dispõem de luz solar artificial, plantas, gramados. Para não falar em “jardim subterrâneo, piscina, spa, cinema e adegas.” Ou em bibliotecas luxuosas, suítes e alcovas 5 estrelas.



Uma das empresas que estão faturando alto com esse Luxo Apocalíptico é a Vivos (terravivos.com), que em sua página de acolhida afirma:

VIVOS não é apenas uma empresa que produz abrigos subterrâneos. É uma rede de comunidades de pessoas com mentalidade semelhante, que dão apoio umas às outras para que tenham melhores chances de sobreviver praticamente qualquer desastre.


(Vivos Europa One: um dos 34 apartamentos 5 estrelas deste complexo)

Outra empresa é a Rising S Company, cuja instalações são meio espartanas comparadas à fidalguia da Vivo, mas tornam-se sedutoras quando você faz a conta na ponta do lápis e percebe que esse abrigo pode ser financiado a partir de 65 mil dólares, um preço mais ao alcance da classe-média norte-americana (imagino eu).


A matéria cita também o saite da companhia tcheca The Oppidum, que se anuncia como O Maior Bunker de Bilionários do Mundo. Fui olhar, todo animado, e me deparei com esta página de acesso:



Mas enfim... A situação é esta. Não está fácil para nós, que temos tão pouco a perder; como minimizar a angústia de quem está correndo o risco de perder bilhões?!

Essa angústia gera outro tipo de problemas, relatados por Douglas Rushkoff (https://en.wikipedia.org/wiki/Douglas_Rushkoff) na matéria Sobrevivência dos Mais Ricos. Diz ele que foi convidado, meio laconicamente, para dar uma palestra para “banqueiros de investimentos”, recebendo como cachê da palestra o equivalente a seis meses de seu salário como professor.
Chegando no local, descobriu que a palestra não era num teatro ou auditório. Era numa sala, ao redor de uma mesa onde estavam sentados cinco homens. Ele estava ali como consultor especializadíssimo para as perguntas que estes cinco homens tinham a fazer.

“Que região vai sofrer menor impacto na crise ambiental: Nova Zelândia ou Alasca? O Google está mesmo construindo um receptáculo para o cérebro de Ray Kurzweil, e será que a consciência dele continuará se mantendo durante e após a transferência? E como será possível manter a lealdade das equipes de segurança que estarão cuidando do meu bunker após O Evento [era este o termo empregado continuamente]?”

Para Rushkoff, estes homens, cuja fortuna pessoal e poder político é equivalente à de outros mais famosos (Bill Gates, Elon Musk, Jeff Bezos, etc. etc.) não estão mais preocupados em investir seu dinheiro para evitar O Evento, ou minimizar suas consequências. Sua preocupação é sobreviver a O Evento com segurança; e emergir, de algum modo, depois que a tempestade passar.















quarta-feira, 25 de julho de 2018

4370) Os inimigos da Memória (25.7.2018)




(Palácio Monroe, Rio de Janeiro)

Muitos episódios recentes na Paraíba e no Brasil me levam a pensar nas pessoas que destroem nosso patrimônio cultural, que roubam obras de arte para vender, que deixam tesouros históricos se estragarem. Quem são essas pessoas? Por que fazem isto? Decidi tentar agrupá-las em algumas categorias.

Existe, por exemplo, o *Lucrador Predatório*. É uma figura típica do capitalismo selvagem que se alastra pelo Brasil como uma impingem fora de controle. O Capitalismo Selvagem é um processo que age às cegas, visando apenas o próprio lucro, cada vez maior, cada vez mais rápido. É diferente do Capitalismo Civilizado, que lucra, produz, enriquece os acionistas, mas ao mesmo tempo se preocupa com questões sociais, patrocina as artes, protege o meio ambiente, trata bem os operários.

O Capitalismo Civilizado é prudente, pensa no futuro, faz as coisas com a intenção de continuar existindo e faturando por séculos a fio. O Capitalismo Selvagem não: é um inseto predatório, que quer devorar tudo que aparece à sua frente, e no menor espaço de tempo possível. Destrói tudo que há à sua volta, e com isto acaba destruindo a si mesmo. Se o deixarem à solta, em 50 anos ele transforma a Amazônia no deserto do Saara, e morre de fome e sede.

O *Lucrador Predatório* é o cara que bota abaixo o prédio onde um jornal funcionou por 50 anos e faz ali uma farmácia. É o cara que está fazendo um filme e para filmar uma cena manda serrar uma árvore que já estava ali quando Pedro Álvares Cabral chegou em Porto Seguro. É o cara que derruba um chafariz do século 18 para construir uma garagem para sua camionete.

Ele não tem nada específico contra o patrimônio, contra a memória, a não ser quando eles prejudicam seus interesses. Ele é como um gafanhoto: quer apenas devorar o que aparece à sua frente.



(Castelo da Prata, Campina Grande)

Um tipo menos sinistro mais igualmente ameaçador é o *Modernizador Angustiado*. Este, quando destrói alguma coisa antiga, sabe muito bem o que está fazendo, e faz de propósito. Mas ele faz movido pelo que considera uma boa intenção.

Em geral ele foi criado numa comunidade muito conservadora, retrógrada, de mentalidade imobilista. No mundo em que ele cresceu, coisas novas eram vistas com suspeita. Todo mundo tinha que fazer as coisas exatamente como seus pais e avós tinham feito. Havia padrões eternos de comportamento a serem seguidos sem discussão.

Quando esse indivíduo fica adulto, ou consegue algum tipo de poder, ele começa a combater essa força repressora que o angustiou durante a vida inteira. Ele está tomado de ressentimento contra tudo que é velho, tudo que é arcaico, tudo que representa o passado. Ele se deixou seduzir pelas coisas novas e modernas que viu pelo mundo, ou das quais ouviu falar. Ele quer fazer com que estas coisas novas tenham uma chance; quer trazer um pouco de ar puro àquele ambiente tão asfixiado pelo passado, pela eterna repetição das mesmas coisas.

E nesse impulso ele começa a combater tudo que parece velharia. Não adianta dizer que tem valor histórico. Para o Modernizador Angustiado, o mundo já tem História demais, Passado demais. Ele é um fanático pelo futuro, e para impor o que ele acha ser o futuro é capaz de implodir a Catedral de Notre Dame ou de aterrar os canais de Veneza.



(Casa Navio, Recife)

Um terceiro tipo, muito curioso, é o *Desinformado Catastrófico*. Ele destrói sem saber que está destruindo. Muitas vezes por não ter tido educação, por não ter acesso a informações, ou apenas porque não prestou muita atenção no que estava fazendo.

É o sujeito que assume uma repartição e manda jogar no lixo aquelas caixas e caixas de papéis velhos “que só servem para ocupar espaço”. É a turma que vai fazer acampamento num parque florestal, acende um fogo para fazer café, e destrói não sei quantos mil hectares de Mata Atlântica, num incêndio que precisa de mil bombeiros para ser contido. É o síndico que não gosta de um mural e manda arrancar todos os ladrilhos, sem perguntar quem fêz aquilo ou quando.

O *Desinformado Catastrófico* fica compreensivelmente magoado quando a imprensa e as entidades civis caem de pau em cima dele, como se ele fosse um criminoso. Ele não se considera um criminoso. Os delitos que pratica não são dolosos (com intenção de prejudicar), mas são culposos, porque prejudicam.

Existem muitos outros tipos, mas acho que por enquanto bastam estes para dar uma idéia do quanto este problema é complicado. Um erro freqüente da imprensa e dos órgãos de proteção ambiental é não distinguir muito bem quem causou o prejuízo ao Patrimônio Histórico e por quê.

Existe gente que precisa de esclarecimento, de informação; gente bem intencionada mas que errou porque não avaliou bem o que estava fazendo. E existe gente mal-intencionada mesmo, que sabia muito bem o que fazia, e que precisa pegar uma boa punição para não fazer de novo.

Gostaria de lembrar também, nestas poucas linhas, que quando a gente protege um casarão antigo, um documento com séculos de idade ou um trecho do meio ambiente não faz isto apenas por amor ao Passado. É também por amor ao Futuro.

O Futuro, as gerações futuras, nossos filhos e netos, precisam conhecer o mundo em que viverão, e isto inclui conhecer aqueles objetos ou espaços que tiveram uma significação especial nos tempos já vividos por outras pessoas. É possível fazer coexistirem o amor pelo Novo e o amor pelo Antigo. Que melhor exemplo disto do que as cidades da Europa e da Ásia, onde se encontram casas com séculos de idade, ruínas com milhares de anos ao lado de arranha-céus modernos?



(Cine Metrópole, Belo Horizonte)

Li certa vez uma entrevista de um escritor onde ele dizia ter visitado um moderníssimo prédio de escritórios em Londres. No andar térreo havia um saguão imenso, com uns 20 metros de altura, onde centenas de pessoas andavam em todas as direções, pegavam elevadores, etc.

No meio desse saguão, havia uma pequena capela dentro da qual cabiam talvez uns 15 pessoas. Era uma capela do século 10, construída pelos antigos habitantes daquela colina. Quando o edifício foi construído, o projeto, em vez de derrubar a capela, procurou restaurá-la e protegê-la, construindo em volta dela aquele saguão enorme.

E quando se entrava na capela, havia uma abertura no solo, que dava para uma escada de pedra, por onde se descia até as ruínas de um templo romano, muitos séculos mais antigo que a capela, que ficava por baixo dela.

Nessa imagem (edifício de 1980, capela do ano 900, templo romano de antes de Cristo) está sintetizada a noção do tempo histórico que podemos experimentar. Na História, o Novo não precisa necessariamente destruir o Antigo. Relíquias de diferentes épocas podem existir lado a lado. É só saber. É só cuidar. É só lutar para que alguém não destrua, seja por cobiça, por maldade, por descaso ou por mera desinformação.


(Uma primeira versão deste texto foi publicada no livro A Cadeia Velha de Pombal – Manifesto em Defesa do Patrimônio Histórico, org. José Tavares de Araújo Neto e Werneck Abrantes de Sousa / Pombal: 2004)









sábado, 21 de julho de 2018

4369) O Jardim das Cidades que se Bifurcam (22.7.2018)





O primeiro conto de Jorge Luis Borges publicado em inglês não saiu em nenhuma publicação acadêmica nem em algum volume hardcover das editoras de literatura erudita. Naquele tempo, nenhum curso universitário de literatura nos EUA e nenhum editor dos selos de maior prestígio já tinha ouvido falar naquele obscuro beletrista de Buenos Aires.

A honra da publicação coube a uma revista de contos policiais, o Ellery Queen’s Mystery Magazine, que sob a direção de Frederick Dannay procurava expandir os limites da literatura de mistério. Dannay publicava romances sob o pseudônimo “Ellery Queen” juntamente com seu primo, Manfred B. Lee; e editava, além da revista, numerosas antologias onde desencavava contos de crime ou de mistério escritos pelos grandes nomes da literatura.


(Frederick Dannay e Manfred B. Lee: "Ellery Queen"]

Em algumas antologias suas que tenho, aparecem nomes como os de Aldous Huxley, Mark Twain, Sinclair Lewis, Robert Graves, W. B. Yeats, Walt Whitman, Henry Wadsworth Longfellow...  Dannay era um  apreciador da grande literatura, e durante a vida inteira se esforçou para ver a literatura de crime ser também levada a sério pelos críticos.



No número de agosto de 1948 de sua revista, Dannay produziu uma edição especial intitulada “All Nations Issue”, publicando contos de autores da Inglaterra, Bélgica, Hungria, Portugal (“The Maul, the Sword and the Sharp Arrow” de Victor Palla), Rússia, França, Tchecoslováquia, Itália, Nova Gales do Sul (Austrália), Filipinas, África do Sul, Canadá e Argentina.



O conto argentino era “The Garden of Forking Paths” (“El Jardín de Senderos que se Bifurcan”), de Jorge Luis Borges, traduzido por Anthony Boucher.

Não se deve subestimar a participação de Boucher no processo, pois “Ellery Queen” (Dannay), em sua introdução a este conto, afirma:

Foi o sr. Boucher que teve a idéia de traduzir [o conto] e de persuadir o autor a submeter a história ao Terceiro Concurso Anual do EQMM. Somos gratos a esse duplo papel do sr. Boucher como parteiro de mistérios – porque de outra forma nenhum de nós teria o prazer de ler o que ele considera “um pequeno clássico”. Ao seu modo muito peculiar, [o conto] é exatamente isso – uma obra-prima em miniatura. (pág. 101)

Boucher é pouco traduzido no Brasil. Talvez tenham saído alguns contos seus, policiais e de ficção científica, em nossas revistas. Romances, só lembro de ter lido um: O Caso do Valete Amarrotado, que saiu nos áureos tempos da Editora Vecchi, no qual encontrei pela primeira vez a curiosa proposta do “xadrez quádruplo”, jogado simultaneamente por quatro pessoas.

O conto de Borges, aparentemente, foi bem recebido pelos leitores, porque voltou a ser publicado: saiu, juntamente com outros do “All Nations Issue”, na antologia de fim de ano The Queen’s Awards: 1948 (Boston: Little, Brown). Foi repetida ali a introdução de Queen, onde ele afirma a certa altura:

O Señor Borges é uma importante figura literária argentina – poeta, crítico, ensaísta e antologista. (...) Sua obra revela outro permanente subterfúgio: ele tem uma inclinação extraordinária pela falsa erudição. É capaz, por exemplo, de inventar um autor ou um movimento literário totalmente apócrifos, e depois escrever uma erudita dissertação sobre a esotérica importância desse indivíduo ou desse movimento imaginário; mas a fantasia e a sátira que ele tece com suas opiniões críticas não deixam de ter significado factual.



Como sabem os leitores, o conto é narrado na primeira pessoa por Yu Tsun, um espião chinês a serviço da Alemanha, na Inglaterra, durante a Primeira Guerra Mundial. Descoberto e perseguido pela contra-espionagem britânica, Yu Tsun pega um trem e vai a um subúrbio distante ao encontro de um sinólogo, o dr. Stephen Albert.

Depois de uma erudita discussão sobre literatura e sobre uma teoria das ramificações do Tempo, Yu Tsun assassina Albert com um tiro pelas costas. Por que? Nas últimas linhas do conto, ele explica: precisava, “através do estrépito da guerra”, comunicar ao Estado Maior alemão o nome da cidade que abrigava as tropas aliadas e que devia ser bombardeada.

A cidade era a cidade francesa de Albert, perto da fronteira belga. Seu único recurso foi matar um homem inocente que tinha este nome, sabendo que o crime sairia em todos os jornais, junto com a notícia de sua prisão; e os alemães entenderiam o recado.

A primeira publicação do conto de Borges foi em 1941, no livro El Jardín de Senderos que se Bifurcan – depois reunido com outro, Artificios, e os dois saindo em 1944 com o título conjunto e definitivo de Ficciones.

Um aspecto interessante da tradução de Anthony Boucher é que ele, por conta própria (com ou sem permissão, ou conhecimento, de Borges?) trocou na versão em inglês a palavra mais importante do conto. Uma espantosa licença tradutória que raramente vi na vida.

De fato, a palavra-chave do conto é “Albert”, nome da cidade francesa ameaçada pelas tropas alemãs e nome do personagem assassinado pelo espião. Mas no texto em inglês, o sinólogo morto por Yu Tsun chama-se Stephen Corbie. “Corbie” é outra cidade francesa, próxima de Albert. Ambas foram envolvidas na Batalha do rio Somme (1916), uma das batalhas mais sangrentas da História, com mais de um milhão de mortos.



Talvez o tradutor tenha achado que para o leitor norte-americano de 1948 a cidade de Corbie evocava mais a Batalha do Somme do que a cidade de Albert.

Robert Irwin, num dos melhores livros já escritos sobre a obra de Borges (The Mystery to a Solution: Poe, Borges and the Analytic Detective Story, Baltimore: The Johns Hopkins University Press, 1994), discorre longamente sobre este conto, mencionando não apenas a cidade de Albert como a figura do rei Albert da Bélgica, um personagem heróico na resistência às tropas alemãs nesse mesmo período.

A troca de “Albert” por “Corbie” é um desses pequenos mistérios literários que dificilmente serão esclarecidos; há vinte anos que tento encontrar uma pista de como foi negociada essa substituição, sem resultado.

A Batalha do Somme foi um dos pontos altos da I Guerra Mundial, e foi travada quando Borges, com 17 anos, estava morando em Genebra (Suíça) com sua família. Pode-se imaginar a impressão que terá deixado em sua memória.

E este pequeno truque literário de fornecer disfarçadamente uma localização geográfica me lembra um outro episódio desse período. Que talvez não fosse desconhecido por Borges.

Em 1914, quando começou a I Guerra Mundial (que ainda não tinha este nome, é claro), muitos artistas e intelectuais franceses se alistaram para reagir à agressão militar alemã; era uma guerra que (acreditava-se na época) duraria apenas alguns meses.


(Guillaume Apollinaire]

Em 1915, o poeta Guillaume Apollinaire, então com 35 anos, estava alistado no 38º. Regimento de Artilharia, adestrando-se para ir para a frente de batalha. Apollinaire era italiano de nascimento, descendente de russos e poloneses, mas emigrou para a França e afrancesou seu nome original. Atribui-se a ele, entre outras coisas, a criação do termo “Surrealismo”.

Enquanto treinava em seu regimento, Apollinaire recebeu uma carta de outro poeta francês, seu grande amigo Blaise Cendrars, que já estava servindo na frente de batalha. (Cendrars viria a ter, depois, uma interessante participação no Modernismo brasileiro, sendo amigo de Oswald de Andrade e outros.)


(Blaise Cendrars]

Nessa carta a Apollinaire, Cendrars, sujeito à censura de correspondência de tempos de guerra, como qualquer soldado, escreve:

Não posso te dizer onde nós estamo.
(“Je ne peux pas dire où nous somme »)

O erro proposital na última palavra (que a censura não percebeu) revela que ele estava no norte da França, justamente na região do rio Somme. Onde ele viria a perder o braço direito em combate, pouco tempo depois.


(Cendrars, por Robert Doisneau)










quinta-feira, 19 de julho de 2018

4368) Conto com final, e conto sem final (19.7.2018)




Há mil maneiras de classificar o conto, como gênero literário. Miniconto e conto longo (ou noveleta); conto concreto  e conto abstrato; conto narrativo e conto descritivo; e assim por diante, mil emparelhamentos dois-a-dois.

Charles Kiefer tem um livro bastante útil, A poética do conto / De Poe a Borges, um passeio pelo gênero (Leya, 2011) onde ele propõe uma dessas divisões polarizadas. Para ele, existem, neste sentido específico, duas variantes do conto: a variante da modernidade ocidental, e a variante da modernidade oriental.

Na modernidade ocidental, pratica-se “o conto nascido com a industrialização, filho da locomotiva e da imprensa”: o conto propriamente narrativo, em busca de um efeito intenso e concentrado, teorizado principalmente por Edgar Allan Poe. O conto com começo, meio e principalmente fim – em geral um fim espantoso, ou inesperado, ou bruscamente revelador.

A modernidade oriental não se refere à China ou Japão, mas à influência do conto russo, aquele estilo cujo mestre foi Anton Tchecov. O conto que mostra um ambiente, narra o que sucede com algumas pessoas ali e se interrompe, ou se esvai, ou se prolonga até desaparecer. Nas palavras do autor:  o conto “que abre mão do final de efeito, em nome da criação de uma atmosfera. Nessa variante, se enquadrariam autores como Franz Kafka, Katherine Mansfield e Raymond Carver, por exemplo”.

Sempre ressalvando (é claro) que a maioria dos autores, principalmente os que publicaram muito, podem oscilar (por influências e motivações diversas, ao longo do tempo) entre uma modalidade e a outra.


Há um episódio curioso no Grande Sertão: Veredas em que Guimarães Rosa, à sua maneira solerte e pretextual, teoriza um pouco sobre essas duas maneiras de narrar.

Rosa (tenho falado isto com frequência) praticou todo tipo de conto: o narrativo, o descritivo, o curto, o longo, o realista, o fantástico, o trágico, o cômico. Se a gente fizesse antologias temáticas relativas a tudo isto ele apareceria com brilho em todas.

No Grande Sertão, Riobaldo conta a certa altura (pág. 81-82 da 2ª. edição) a história de dois jagunços amigos, o Davidão e o Faustino, do bando de Antonio Dó, que fazem um pacto.

(Já começa pelos nomes: Davidão é aumentativo de Davi, um Davi metido a Golias; Faustino é um diminutivo do Doutor Fausto, um pactário de renome.)

Com medo de morrer, Davidão trata com Faustino, mediante algum ritual, dar-lhe dez contos de réis para, chegada a hora dele, Davidão, quem morra seja ele, Faustino. O outro aceita, em parte pelos dez contos, em parte porque “no poder de feitiço do contrato ele muito não acreditava”.


Seguem-se alguns combates, nenhum dos dois morre. E Riobaldo comenta ter contado esse “causo” a alguém.

Pois, mire e veja: isto mesmo narrei a um rapaz de cidade grande, muito inteligente, vindo com outros num caminhão, para pescarem no Rio. Sabe o que o moço me disse? Que era assunto de valor, para se compor uma estória em livro. Mas que precisava de um final sustante, caprichado. O final que ele daí imaginou, foi um: que, um dia, o Faustino pegava também a ter medo, queria revogar o ajuste! Devolvia o dinheiro. Mas o Davidão não aceitava, não queria, por forma nenhuma. Do discutir, ferveram nisso, ferravam numa luta corporal. A fino, o Faustino se provia na faca, investia, os dois rolavam no chão, embolados. Mas, no confuso, por sua própria mão dele, a faca cravava no coração do Faustino, que falecia...

Portanto, o “rapaz da cidade grande, muito inteligente” era um defensor da “variante da modernidade ocidental” de um conto. Achava a idéia do pacto ótima – mas faltava nela o que? O desfecho incisivo, dramático, surpreendente. O “efeito” defendido e buscado por Edgar Poe.

Riobaldo, no entanto, comenta isso com finura oriental:

Apreciei demais essa continuação inventada. A quanta coisa limpa verdadeira uma pessoa de alta instrução não concebe! Aí podem encher este mundo de outros movimentos, sem os erros e volteios da vida em sua lerdeza de sarrafaçar.

Riobaldo elogia o desfecho imaginário proposto pelo rapaz urbano (visivelmente um tênue substituto do “senhor” a quem o Grande Sertão é narrado). Mas lamenta que a saída sugerida seja mais ficcional do que realista. O rapaz lhe pergunta qual tinha sido, mesmo, o fim da história dos dois.

E ele me indagou qual tinha sido o fim, na verdade de realidade, de Davidão e Faustino. O fim? Quem sei. Soube somente só que o Davidão resolveu deixar a jagunçagem – deu baixa do bando, e, com certas promessas, de ceder uns alqueires de terra, e outras vantagens de mais pagar, conseguiu do Faustino dar baixa também, e viesse morar perto dele, sempre. Mais deles, ignoro.

Ou seja: não houve desfecho dramático. O pacto ficou por isso mesmo. Na vida real não existe um clímax para o qual tudo se encaminha. Riobaldo tem consciência disso:

No real da vida, as coisas acabam com menos formato, nem acabam. Melhor assim. Pelejar por exato, dá erro contra a gente. Não se queira. Viver é muito perigoso...

As coisas acabam com menos formato, claro. Não há roteirista nem romancista “pelejando por exato”, regendo as peripécias do que acontece aqui, fora dos livros.

A literatura segue a “modernidade ocidental”; a vida de verdade rege-se pela “modernidade oriental”. Deve haver alguma lição filosófica a extrair disto, mas como estamos na vida-de-verdade, deixo a história morrer por aqui, sem sugerir um final para ela.



(ilustrações: Poty Lazzarotto)






segunda-feira, 16 de julho de 2018

4367) A casa entre as sombras (16.7.2018)




A arte de contar histórias é uma arte que se fixa como camadas sucessivas. Você tem que escutar dezenas, centenas de histórias (na infância, de preferência) até dominar mentalmente os mecanismos de “aconteceu isso, e por causa disso aconteceu aquilo”, ou “e agora, o que vai acontecer, isso ou aquilo?”, ou “enquanto isso está acontecendo aqui, aquilo está acontecendo noutro canto”...

É a sintaxe básica dos enredos, das narrativas onde existem relação de causa e efeito entre os personagens.

Quando o autor sabe que pode contar com leitores habituados a isso, ele pode comprimir um enredo como quem comprime uma mola – fazendo-o ocupar um lugar menor mas mais carregado de energia.

Um bom conto é como um romance comprimido no menor espaço possível. A gente tem a sensação de que se encostar a pontinha do dedo na página o conto dá um salto no ar e se transforma num livro de 200 páginas.

E numa fase muuuito posterior à infância o leitor chega àquele ponto em que basta uma frase inicial estalando o dedo para que ele comece a fantasiar, cheio de expectativa.


Vi um texto de Dwyer Murphy, no saite Electric Literature, comentando o trailer do filme The Big Sleep de Howard Hawks (1946). No trailer, Humphrey Bogart, vestido como Philip Marlowe, entra numa biblioteca, pede ajuda à bibliotecária, e ela lhe oferece o livro The Big Sleep de Raymond Chandler. Ele abre, folheia, e começa a ler:

Às vezes me ponho a imaginar que estranho destino me conduziu, numa noite de tempestade, àquela casa que se erguia sozinha no meio das sombras...

Essa frase não está nem no livro de Chandler nem no filme. Ela apenas sugere o sangrento confronto final, que de fato é numa casa afastada, na zona rural, numa noite de chuva. Deve ter sido escrita pelo roteirista do trailer. (Que aliás nunca é o roteirista do filme).

A frase não tem nenhum grande mérito literário, mas é uma espécie de invocação mágica para leitores de histórias de mistério. É uma frase que nos joga no território arquetípico da Narrativa Em Redor Da Fogueira (ou da lareira do clube londrino, etc. etc.).

“Às vezes me ponho a imaginar que estranho destino me conduziu...”:
É uma história na primeira pessoa; aconteceu à pessoa que a conta. Sabemos logo que pelo menos o narrador “escapou para contar a história”.

“...que estranho destino...”:
Forças invisíveis e poderosas moldaram a história. O herói pôde no máximo antevê-las e adaptar-se.

“...numa noite de tempestade...”:
A noite escura da alma, a floresta selvagem onde nos perdemos à noite, no meio do caminho desta vida. A Natureza convulsa é um dos símbolos mais antigos de um Inconsciente indócil.

“...àquela casa que se erguia sozinha...”:
A casa isolada, sem ninguém por perto; símbolo do espaço fechado, a ilha cercada de vazio por todos os lados, “onde ninguém ouvirá você gritar”.

“...no meio das sombras...”:
No meio da nossa incapacidade de pressentir o que vai acontecer, de corresponder ao que está acontecendo, de entender totalmente o que aconteceu.

O trailer pode ser visto aqui:

Se me dou o trabalho de fazer essa análise toda é porque essa frase inicial me emociona atavicamente, e dificilmente deixarei de ler (ou pelo menos tentar) um conto ou livro que comece assim.

É uma espécie de “Era uma vez...” para adultos que apreciam o romance gótico ou o conto fantástico.


E me trouxe à memória uma homenagem feita por Osman Lins em A Rainha dos Cárceres da Grécia. É um romance sobre a literatura: após a morte de uma escritora, seu companheiro lê e comenta com o leitor trechos do romance que ela deixou inacabado.

Refletindo sobre histórias narradas numa roda de amigos, ele diz:

(...) O núcleo da situação – o conto, o narrador, o ouvinte e o abrigo – permanece:

Havia sobre a mesa uma pequena lâmpada com abajur. Guarneciam a lareira um itinerário, um almanaque, o tinteiro com uma pena e meio bastão de lacre. Ele pedira dois conhaques duplos com o café e estava encolhido na poltrona. Envolvia-nos a esquisita sensação de intimidade que proporcionam as salas repousantes e silenciosas do Hotel Plaza.
– Serei importuno se lhes contar o caso? Sucedeu com um amigo do meu tio e, desde então, oitenta anos se passaram.

A citação é imaginária, unindo fragmentos de Dickens e de Maugham. Que romancista, entretanto, não reconhece aí o ofício de contar, a união com o leitor e a ânsia de ser ouvido longe do tumulto do mundo?
(págs. 80-81)

O romance contemporâneo que se pretende objetivo, seco, realista, tem incontáveis virtudes, mas há uma faixa muito grande de leitores que, como eu, gostam de ler uma história sabendo que é história, uma história que já se assume como coisa contada desde as primeiras palavras.