(Saul Steinberg)
Fala-se que no Oriente
há uma cordilheira de montanhas de calcário escavadas por dentro, formando uma
colmeia de galerias. Vive ali um povo frugal e contemplativo. Seus poetas
diferem dos de outros lugares pelo fato de que não escrevem: compõem suas obras mentalmente, às vezes em silêncio,
às vezes em voz alta. Exploradores e turistas europeus já foram admitidos às
câmaras internas onde eles vivem sem jamais saírem, alimentados e mantidos pela
comunidade.
Lord Gregson informa,
em Journeys Through the Lands of the Sun, que foi conduzido ao longo de um
corredor por um guia que lhe recomendava silêncio. Os corredores cavados na
pedra são baixos, e um europeu precisa curvar-se para atravessá-los. No fim,
numa câmara circular com uns seis metros de diâmetro, via-se uma esteira
simples, onde um homem estava sentado. Quando Gregson entrou, ele se servia de
água de uma bilha, num caneco de barro. Gregson e o guia se sentaram; o homem
não pareceu dar pela sua presença. Ficou concentrado, as mãos pousadas sobre os
joelhos, e depois de meia hora fechou os olhos e recitou uma longa sequência de
frases que deixaram o guia emocionado. Ele explicou depois a Gregson que o
homem tinha contado o reencontro entre um homem e seu cavalo. Os dois haviam se
perdido numa batalha, muito tempo atrás, e nesse dia o cavalo, reconhecendo o
guerreiro no meio de um curral cheio de gente e animais, galopou até ele e se
ajoelhou aos seus pés.
Criam histórias assim,
para si e para ninguém, ou melhor, para os curiosos (em geral crianças e
velhos) que se dão o trabalho de visitá-los. Não têm o direito de escrever,
porque escrever seria partir o fio de inspiração que liga o poema ao poeta. O
poema (diz aquele povo) pertence ao corpo do poeta, nasce nele, deve morrer com
ele. Fala-se que algumas tribos, mais radicais, cortam a língua dos poetas para
que nem mesmo a palavra falada quebre esse vínculo.