sábado, 24 de agosto de 2013

3273) A visita do Conde (24.8.2013)




(by Ralph Eugene Meatyard)

A morte repentina do Conde d’Aureville, em 1897, emocionou a Bretanha inteira, e ao seu funeral compareceram autoridades de oito países. Era autor de romances, de crônicas da corte, e de uma vasta correspondência com fidalgos e damas de toda a Europa. Sua coleção de documentos políticos foi doada ao Vaticano, mas sua biblioteca pessoal era o deleite dos pesquisadores de muitos países. Uma noite, no salão octogonal da biblioteca, estavam pesquisando documentos e fichários dois biógrafos (o húngaro Besolz e o alemão Scarblitz) e uma estagiária (a canadense Strumm). Os três trabalhavam a uma distância mediana entre si, por entre as estantes e arquivos. Naquela noite, foi como se uma mão gigantesca tivesse girado num botão. Houve como que uma ionização na atmosfera, o ar estralejou de energia, como se um toque de ponta de dedo emitisse um raio.

Eles se refugiram correndo junto à mesa central do aposento, onde a turbulência parecia ser menos intensa. No centroda sala, numa cascata de tremulações coloridas, apareceu o Conde d’Aureville. Sobranceiro, fornido, o chapéu de pluma arrogante, os copos da espada pronta para o desembainhar. Mas estava sereno, e olhou nos olhos cada um dos três intrusos. Sua voz era calma. Deu a cada um o direito a uma pergunta.

Besolz ergueu o braço. “Sire, estou consultando vossa correspondência, mas não sei quem é a tal Sereia que vos escrevia tanto.”  O Conde o encarou e disse: “Se és pesquisador mesmo basta dizer: é a mesma que um dia dirá sob outro nome que aprendeu comigo a amar a noite.”  Besolz assentiu devagar, com uma cara de quem já conseguiu metade do que queria.

“E tu?”, perguntou o Conde. “Mais de mil cartas militares,” queixou-se Scarblitz. “Tenho estudado muito mas não entendo tantas manobras, tantos armamentos, tantas combinações.” “Nem eu,” disse o Conde. “Limitei-me a copiar as cartas de uns generais para os outros, e dos outros para os uns. Ser político é ter uma dedução correta sobre o que acontece, com dados colhidos pelos outros.” O homem ficou calado. O Conde continuou: “Esquece isso. Procura minhas cartas com os ministros da Polônia e da Transbalcânia. Todo o resto é consequência dessas.”

Virou-se para a moça de rabo-de-cavalo louro. Ela lhe disse: “Senhor, há um código, não é verdade? Não o decifrei ainda mas percebi uma intercalação de letras sem sentido. É um código?” A imagem do Conde tremulou e, com um relâmpago cegante, desapareceu. Os três mal acreditaram no que tinham ouvido. Na manhã seguinte, a canadense apareceu morta durante o sono, com uma expressão de triunfo no rosto claro.