quarta-feira, 13 de agosto de 2014

3576) Um autor novo (13.8.2014)




Descobrir um autor novo (novo pra mim, claro) me remoça. Mesmo quando eu já supervisionava o tráfego da literatura universal do alto dos meus vetustos 50-e-tantos anos, era extraordinário o quanto o mundo voltava a ficar grande quando eu fazia uma nova descoberta.  


Às vezes era um autor de quem eu só conhecia o nome, vagas referências. Um dia, eu começava a folhear um volume na livraria, sem muito interesse, dava uma conferida no que vinha logo abaixo de “Capítulo 1”, e quando voltava a mim estava na página 35, sob os olhares suspicazes dos atendentes. Em casos assim, já me ocorreu ir no caixa, pagar, sair da livraria e continuar a leitura de pé, na calçada, por entre os transeuntes, figurantes involuntários da epifania.

Ou então o cara está lendo uma antologia, ou uma revista literária, vê 2 ou 3 poemas de um(a) desconhecido(a), lê, relê, entende, desentende, pergunta de novo, acaba constatando uma espécie de fenômeno. Vai ao Google, depois à Estante Virtual ou à Abebooks... Tá fisgado. 

O primeiro indício de estar fisgado é se flagrar tentando escrever parecido com a figura. “Pronto,” pensa o cara, “era só o que me faltava, ser influenciado por uma poetisa senegalesa que tem idade pra ser minha avó, ou minha neta, tanto faz.”

Muita gente, quando descobre um autor novo, vira propagandista. Xeroca texto, escaneia texto, compra livros na ponta-de-estoque e distribui entre os amigos, vira “cabo leitoral”. Vira tiete e militante de um autor falecido no século passado, ou de um novato que está publicando lá nas brenhas e que ninguém se interessa. 

Por que?  Talvez porque um autor novo é como um bar novo que a gente descobre. O bar é ótimo, mas a gente não quer ficar lá sozinho, ou entre desconhecidos indiferentes. Quer levar a turma de amigos para usufruto em comum.

Há também quem descubra e esconda. Eu já fiz isso. Descobri um novo contista de FC, ou um novo curtametragista polonês, ou uma nova poetisa sulamericana, e não falei pra ninguém, apaguei meus passos, não deixei vestígios de minhas repetidas peregrinações ao pé de suas páginas. 

Por que? Talvez pra não quebrar o encanto, não correr o risco de ouvir um dos meus gurus dizer: “Ah, conheço, sim... Mas já passei essa fase...” Eu descubro e escondo. 

Fico com a ilusão benigna de que só eu conheço, só eu gosto, só eu plagio em vão e depois queimo por saber que é plágio, mas no momento de copiar experimento o prazer vicário de todo ator que desdobra no palco uma grande cena e, enquanto joga pra fora aquelas palavras, tem a certeza íntima (por isso a cena é grande) de que tudo aquilo foi ele quem pensou, de que tudo aquilo acaba de ali nascer.