domingo, 6 de fevereiro de 2011

2473) Perdidos na Bienal (6.2.2011)




O estudo da Patologia Topológica vem enfrentando preconceitos dentro da comunidade científica internacional. Como toda ciência nova, ela lida mais com perguntas e incertezas do que com verdades chanceladas pelo uso e pela experimentação controlada. Daí ser considerada por uns uma pseudo-ciência e por outros um delírio paranóico. 

A Física contemporânea, por exemplo, estuda o que a literatura popular chama de fendas no espaço-tempo, fissuras no tecido no Universo. Sua existência em escala macro já foi comprovada – são os famosos “buracos de minhoca” nos quais uma partícula física entra, e sai, quase instantaneamente, noutro local, a milhares de quilômetros ou milhões de anos-luz. 

O que a Patologia Topológica estuda é a existência deste fenômeno na escala humana. Muitos desaparecimentos famosos, acidentes, fatos extraordinários, podem ser explicados pela ocorrência de fendas desse tipo. Passagens, portais, configurações tão extraordinárias que dentro do seu âmbito as leis que governam a matéria se comportam de forma diferente. 

Estuda-se, por exemplo, o caso da instalação pós-modernista “Klax”, do artista indiano Raman Sendjabi. Influenciado (segundo ele próprio) pelos parangolés do brasileiro Hélio Oiticica, Sendjabi criou um labirinto de placas de amianto e isopor, no qual os participantes eram convidados a entrar e experimentar, segundo ele, “sensações temporárias de perda da referencialidade espaçotemporal”. 

A obra foi exposta na Bienal da Lausanne em 2002 e causou escândalo pelo desaparecimento de seis pessoas, inclusive duas crianças, que entraram ali e não saíram; depois de horas de espera, e sob protestos do artista, a obra foi desmontada diante da polícia e dos curadores da exposição, mas sem sinal das pessoas. 

No ano seguinte, 2003, Sendjabi (processado pelas famílias dos desaparecidos) conseguiu uma liminar para remontar sua instalação na Bienal de Cracóvia. Qual não foi a surpresa de todos quando, no dia de abertura, emergiram da obra quatro dos desaparecidos, todos levemente desnutridos e anêmicos, mas em boas condições físicas. Foram incapazes de explicar e mesmo de entender o que se passara; com amnésia parcial, não faziam ideia de que tinham estado desaparecidos por cerca de um ano. 

Novo escândalo forçou a desmontagem da obra e novo processo movido contra Sendjabi. Em 2004, sob forte cobertura da imprensa, “Klax” foi remontada na Bienal de Osaka, e embora ninguém se atrevesse a penetrar em seu labirinto, logo emergiu dali a secretária suíça Michelle Lamproix, igualmente amnésica e desnorteada. Para ela, pouco mais de meia hora tinha transcorrido desde sua entrada no labirinto, dois anos antes. 

A última pessoa desaparecida era um taxista de Lausanne, de 22 anos, Jean-Marc Desmolieu. Na Bienal da São Paulo de 2010, quando “Klax” foi reexposta, ele não apareceu, mas jogou para fora do labirinto o manuscrito de um texto sobre arte pós-moderna, que está sendo decifrado pelos especialistas.