(Norman Rockwell, "Antenne")
Alfred Hitchcock considerava um dos seus melhores filmes Sombra de uma Dúvida, onde Joseph Cotten faz o papel de Charlie, um charmoso assassino que seduz e estrangula viúvas ricas. O filme começa com ele pegando suas economias e fugindo para a Califórnia, onde mora sua irmã mais velha, que o idolatra. Ali, Charlie pretende levar uma vida tranquila, numa cidadezinha do interior. Mas não demora e dois detetives vão ao seu encalço; sua sobrinha (freudianamente também chamada Charlie) começa a suspeitar dele, e tudo se precipita para um clímax previsível.
Hitchcock dedica o filme ao co-roteirista Thornton Wilder, que pegou a sinopse inicial de Gordon McDonnell e a ambientou numa típica cidadezinha norte-americana. Este foi um dos aspectos que mais interessaram o cineasta: mostrar “o Mal que se oculta no coração dos homens”, e que invade mesmo os ambientes mais pacatos e provincianos. No filme, Tio Charlie é o sujeito cosmopolita, fino, viajado, cujas experiências não deixam de fascinar e embevecer seus parentes interioranos; ao mesmo tempo, ele tem algo de oculto em seu passado. Tem conhecimento das maldades do mundo, e isso o torna um homem perigoso.
Thornton Wilder é o autor de Nossa Cidade, um clássico do teatro americano em que ele começa mostrando a face idílica e termina mostrando a face trágica de Grover´s Corners, uma “cidadezinha qualquer”. É uma equação cruel: modernização = passagem do tempo = morte. Nas cidades pequenas, no meio rural, a modernização tanto pode ser um sinal de vida quanto de morte. Modernização significa que florestas serão abatidas, velhos prédios serão demolidos, profissões tradicionais serão extintas, objetos domésticos serão substituídos. As novidades que vêm de fora podem ser vistas como o nascimento do Novo, mas também como a morte do Antigo, de tudo aquilo que tinha sido, até então, o mundo em que vivíamos.
E as novidades da Cidade Grande vêm, também, tingidas de maldade, de materialismo, de desprezo pelo ser humano. Num dos diálogos mais arrepiantes do filme, Tio Charlie diz à sobrinha: “Não se iluda com o mundo, Charlie. Arranque as fachadas destas casas, e verá que dentro delas só existem porcos.” No primeiro momento de alegria com a chegada do tio, Charlie diz: “Eu sinto que dentro de você existe algo que ninguém mais sabe, alguma coisa secreta e maravilhosa, e eu vou descobrir o que é.” É a fascinação infantil do provinciano diante dos mistérios da mente cosmopolita, que logo é substituída pelo terror infantil do provinciano quando a resposta a estes mistérios abala suas ilusões éticas e morais. O mundo lá fora é mau, diz Hitchcock pela boca do Tio Charlie. Existia uma pureza nas cidadezinhas norte-americanas que não duraria por muito tempo, como se o universo das ilustrações ternas e realistas de um Norman Rockwell fossem sendo invadidas aos poucos por personagens de Quentin Tarantino. O filme, por falar nisso, é de 1943.
Hitchcock dedica o filme ao co-roteirista Thornton Wilder, que pegou a sinopse inicial de Gordon McDonnell e a ambientou numa típica cidadezinha norte-americana. Este foi um dos aspectos que mais interessaram o cineasta: mostrar “o Mal que se oculta no coração dos homens”, e que invade mesmo os ambientes mais pacatos e provincianos. No filme, Tio Charlie é o sujeito cosmopolita, fino, viajado, cujas experiências não deixam de fascinar e embevecer seus parentes interioranos; ao mesmo tempo, ele tem algo de oculto em seu passado. Tem conhecimento das maldades do mundo, e isso o torna um homem perigoso.
Thornton Wilder é o autor de Nossa Cidade, um clássico do teatro americano em que ele começa mostrando a face idílica e termina mostrando a face trágica de Grover´s Corners, uma “cidadezinha qualquer”. É uma equação cruel: modernização = passagem do tempo = morte. Nas cidades pequenas, no meio rural, a modernização tanto pode ser um sinal de vida quanto de morte. Modernização significa que florestas serão abatidas, velhos prédios serão demolidos, profissões tradicionais serão extintas, objetos domésticos serão substituídos. As novidades que vêm de fora podem ser vistas como o nascimento do Novo, mas também como a morte do Antigo, de tudo aquilo que tinha sido, até então, o mundo em que vivíamos.
E as novidades da Cidade Grande vêm, também, tingidas de maldade, de materialismo, de desprezo pelo ser humano. Num dos diálogos mais arrepiantes do filme, Tio Charlie diz à sobrinha: “Não se iluda com o mundo, Charlie. Arranque as fachadas destas casas, e verá que dentro delas só existem porcos.” No primeiro momento de alegria com a chegada do tio, Charlie diz: “Eu sinto que dentro de você existe algo que ninguém mais sabe, alguma coisa secreta e maravilhosa, e eu vou descobrir o que é.” É a fascinação infantil do provinciano diante dos mistérios da mente cosmopolita, que logo é substituída pelo terror infantil do provinciano quando a resposta a estes mistérios abala suas ilusões éticas e morais. O mundo lá fora é mau, diz Hitchcock pela boca do Tio Charlie. Existia uma pureza nas cidadezinhas norte-americanas que não duraria por muito tempo, como se o universo das ilustrações ternas e realistas de um Norman Rockwell fossem sendo invadidas aos poucos por personagens de Quentin Tarantino. O filme, por falar nisso, é de 1943.
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