Suponho que a maioria dos meus leitores sabe o que é Spam. É aquela propaganda feita através da Internet valendo-se de algumas peculiaridades deste meio, entre elas a possibilidade de enviar uma mesma mensagem, a custo quase zero, para milhões de pessoas ao mesmo tempo. Isto é o sonho dourado de qualquer marqueteiro, agente de propaganda, divulgador, etc. Mesmo no tempo da propaganda em forma de papel (o volante, a filipeta, o postal, o folheto, o catálogo, etc.) isso já era posto em prática. Quantas vezes fiquei de pé durante 20, 30, 40 minutos numa fila do Correio, vendo à minha frente um office-boy com alguns milhares de envelopes, todos iguaizinhos, com endereços impressos em etiquetas adesivas, passando naquela maquininha, vrum, vrum, vrum, enquanto eu esperava num-pé-e-noutro com minha cartinha única na mão.
O email reduziu este problemas mas trouxe outros. Já cancelei um endereço de email que usava há muitos anos, porque tornou-se impraticável o número de propagandas não-solicitadas que me chegavam. Ao abrir a caixa, havia cerca de 130 mensagens, das quais talvez meia-dúzia fossem mensagens para mim: o resto eram propagandas enviadas para meu endereço. E tem gente que usa esse sistema para divulgar suas próprias armas: oferecem CDs com “3 milhões de endereços”, ou mais, por um preço módico.
A idéia por trás dessa propaganda é muito simples: 99% dos recebedores vão ficar irritados e apagar a mensagem; 1% vão ter algum interesse pelo produto (os números não são exatamente estes, mas tanto faz). Se você manda 100 mensagens não é bom negócio. Mas se você manda 1 milhão de mensagens a relação custo-benefício é mais interessante, pois teoricamente você atinge um por cento disto: 10 mil pessoas vão ficar sabendo que seu produto existe e podem se interessar em comprá-lo.
O mercado capitalista adora essas fórmulas mágicas. O capitalismo é quantitativo por sua própria natureza, adora soluções quantitativas, de força-bruta (v. coluna “A solução Herodes”, 5 de julho). No mercado musical, por exemplo, adota-se algo muito parecido ao Spam. Um CD de Fulano é lançado, e a gravadora suborna centenas de disc-jóqueis Brasil afora, para ter certeza de que a chamada “música de trabalho” vai tocar o dia inteiro. Com tanta repetição, é possível que 99% por cento das pessoas reajam dizendo “P.q.p., eu não aguento mais essa música chata”, mas 1% vai chegar a balcão da loja e perguntar pelo disco. Quando se lida com dezenas de milhões, basta esse um por cento de retorno para justificar toda a despesa. O que ouvimos em nossas rádios, hoje, não passa de um spam sonoro. Impessoal, massificado, pago a peso de ouro, e inspirado no princípio de que vale a pena incomodar um milhão de pessoas para vender um disco a dez mil. O Spam é o carro-de-propaganda (aquele do alto-falante insuportável) do século 21.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário