
Quando acordou, estava subindo ao longo de uma escada cujos degraus eram tábuas, às quais seus dedos machucados mal podiam se apegar. Entre os degraus ele via a parede que estava escalando, e que parecia feita de cascalho solto. A luz das estrelas lhe dava apenas uma vaga noção de onde se agarrar; passou-se algum tempo antes que ele percebesse que os degraus pareciam estar transversalmente presos a duas barras de ferro luzidias. Experimentou uma delas com a mão, e sentiu-a vibrar, sentiu que ela trepidava numa vibração contínua e crescente. Aos poucos uma luz pareceu vir do alto, enquanto a vibração da escada aumentava a ponto de se comunicar aos seus próprios ossos, quando ele tentava aferrar-se ainda mais aos degraus. Olhando para cima, ele viu que a escada que escalava perdia-se numa altura indefinida mas que por ela vinha descendo rumo a ele uma imensa locomotiva fumegante com um facho de luz à frente.
Acordou com um arquejo de horror e espanto. Estava sentado num gramado à beira de um rio manso. Da água emergia uma jovem loura e alva, quase nua se não fosse pelo vestido diáfano, ensopado, que se colava ao corpo. Ela o avistou e caminhou para ele, os cabelos gotejantes, enquanto ele observava os seios miúdos e firmes, o movimento seguro dos quadris. Ela ajoelhou-se ao lado dele e acariciou-lhe os cabelos, enquanto gotas dágua lhe corriam pelo rosto. Ele ergueu a mão e segurou na mão dela. Uma corrente de milhares de volts atravessou-lhe o corpo, fritando-o com a temperatura do Sol, e despertando-o.
Ao abrir os olhos, estava na cama de um quarto de hotel barato: o único móvel que podia avistar da cama era uma cômoda desconjuntada de madeira, com um espelho oval, uma bacia de metal e uma toalha dobrada. Sentou-se na cama e percebeu que estava vestindo apenas um par de calções frouxos, de pano ordinário, que nunca tinha visto. Levantou-se com dificuldade e foi até o espelho. Não era um espelho: era uma vidraça oval que dava para um poço de elevador, onde ele via os cabos metálicos subindo de um lado e descendo de outro. Um elevador parou bem à sua frente, as portas abriram-se para os lados, e ele gritou ao ver lá dentro um homem de macacão azul, com um machado enterrado no crânio, estendendo as mãos para ele. E acordou.
Abriu os olhos e percebeu que estava num vasto descampado coberto de neve; vestia casaco espesso, luvas enormes, cachecol, gorro protegendo a cabeça. A neve se estendia à sua frente, lisa, intocada, e ele percebeu que estava andando de costas, como se a certa altura de uma caminhada tivesse decidido retroceder. Seus pés pousavam sobre as pegadas às suas costas e, mal se erguiam do chão, deixavam ali a neve intacta. A certa altura, escorregou, caiu, e acordou. Estava empunhando um jornal, percorrendo com os olhos uma coluna compacta de texto escrito, e agora seus olhos estavam chegando às últimas linhas.
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