Não há dois diretores de cinema com estilos semelhantes, a não ser os medíocres. Dirigir um filme é um troço tão complicado que o talento, quando existe, molda aquilo tudo de acordo com seu próprio perfil.
Um dos talentos mais visíveis e mais enigmáticos do cinema americano é Alfred Hitchcock. A imprensa o chama de “O Mestre do Suspense”, o que esclarece tão pouco quanto chamar Ronaldo de “O Fenômeno”.
Se Hitchcock era mestre em alguma coisa, então ele era o Mestre do Storyboard, ou o Mestre do Cronômetro, ou o Mestre da Colocação de Câmara. Seus filmes são preparados com a minúcia e a antevisão daquele pessoal que passa semanas enfileirando peças de dominó num ginásio para derrubá-las todas de uma vez só. Nada acontece por acaso. Todo efeito é previsto.
Stirling Silliphant recorda sua experiência de finalizar um roteiro para Hitchcock na TV. Na primeira reunião que teve, ele descobriu que Hitchcock já tinha o filme inteiro (um episódio de TV, 50 minutos) decupado na mente.
Ele descrevia uma cena inteira, com posições de câmara, cortes, movimentação dos atores, e ao chegar num momento de tensão dizia: “E aqui, Stirling, eu vou precisar de um pouco de diálogo... Tanto assim.” E mostrava ao roteirista cerca de 5 centímetros com o polegar e o indicador.
Essa precisão se chocava com as expectativas de atores que “gostam de trabalhar a emoção”. São famosos os choques entre Hitchcock e Paul Newman durante Cortina Rasgada, uma vez que Newman queria seguir a linha psicológica de interpretação, aprendida no Actor´s Studio, e Hitchcock gostava de dizer coisas tipo: “Você vai até a janela, olha para fora, acena, vem até o centro da sala, pára, olha para a direita, procura alguma coisa no bolso...”
Atores não gostam de se sentir como marionetes. Atores geralmente gostam de saber as motivações e as emoções do personagem, e improvisar esses pequenos gestos com espontaneidade.
O estilo de Hitchcock misturava suspense, humor, comédia romântica. Gostava de extrair o máximo das possibilidades cênicas de um ambiente. Muitos filmes dos anos 1960 são imitações evidentes de seu estilo: Criminosos não merecem prêmio de Mark Robson, A mulher de palha de Basil Dearden, Charada de Stanley Donen. Alguns diluidores, como Brian de Palma, desgastaram prematuramente alguns dos seus cacoetes narrativos ou temáticos.
Como todo diretor muito imitado, Hitchcock acabou fazendo mais mal do que bem ao cinema. Suas melhores sequências são exercícios de implausibilidade, narrados com tal mestria que nem nos damos conta disto. A consequência mais grave é que muitos diretores acham que qualquer coisa sem pé nem cabeça é aceitável, porque há o precedente de Hitchcock.
A obra é numerosa, mas os exemplos mais típicos do estilo hitchcockiano são Pacto Sinistro (1951), Janela Indiscreta (1954), O homem que sabia demais (1956), Um corpo que cai (1958), Intriga Internacional (1959), Psicose (1960) e Os Pássaros (1963).
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