(foto: Andre Kertesz)
Peitoril de uma janela, em preto e branco bem granulado,
sobre o qual repousa, apoiada no braço dobrado sobre o caixilho, a mão de uma
menina de uns dez anos. Ao lado dela, uma pistola calibre 38, carregada,
pousada sobre o peitoril. Na foto, a menina não toca ainda na arma.
Um canal cimentado, com águas verde-azuis, amuradas
vermelhas, três garotos de camiseta e calção, em cores variadas, armando o pulo
para saltar dentro dele, o primeiro já frecheirando de braços esticados em
pleno ar, o segundo dobrando os joelhos e braços pra trás pro impulso final, o
terceiro ainda se posicionando.
Uma estação de trem, acima do nível do pátio em volta. Uma
escadaria de três trechos de doze degraus. E uma mulher, saias esvoaçantes, uma
mala e uma sacola numa mão, uma mala maior e uma bolsa pequena na outra, bolsa
grande a tiracolo em diagonal, uma mulher corpulenta e decidida, está subindo essa
escada enquanto no último degrau um homem alto, magro e moreno a observa, à
espera, com o pulso esquerdo soerguendo-se apenas o mínimo para indicar: “Olha a
hora!”.
Um entrevistador perguntou a Pelé, já de chuteiras penduradas,
qual a coisa do tempo de jogador que ele tinha mais saudade. Ele disse: “O pontapé inicial de todo jogo, quando o time da gente estava no auge. Quando a
gente ir dar a saída, a gente olhava e via o medo nos olhos deles. O medo que
eles tinham do Santos.” A foto mostra esse medo.
Foto noturna do lado de fora de uma “villa” a que se tem
entrada por um pórtico. Do lado de cá desse pórtico, caído rente ao muro,
bêbado, um homem bem vestido. Ao fundo, todas as casas da vila estão apagadas,
menos uma, onde a luz está acesa e há uma mulher debruçada à janela, morta de
sono.
O braço moreno de músculos longos e secos passa a peixeira
com força num serrilhado que sai cortando em diagonal, jogando para o alto uma
chuva de diamantes em forma de escamas de peixe.
Foto muito próxima, não dá para ver se é no meio da rua ou
num clube, mas o ambiente é escuro, e a foto mostra um rapaz e uma moça se
olhando, com gente fantasiada marcando o passo ao fundo. Só os dois, se
olhando.
2 comentários:
Bom dia Braulio, não sei se isso já aconteceu com você mas você já teve um bloqueio de leitor ? Tive um faz quase um ano, me recuperei mas ainda tenho alguns sintomas, as vezes quando leio o ato da leitura não me parece a coisa mais fantástica a se fazer - como deveria ser - e as vezes me vejo lendo menos do que deveria. E a voracidade de leitura ? Vejo gente lendo 100 livros por ano e eu no máximo cheguei a 32 ( contando algumas encadernações de várias HQs em capa dura ). As vezes me parece que sendo um leitor assim a leitura é algo menor para mim quando deveria ser o ápice da atividade intelectual diária quando o mundo do fantástico encontra o sabor literário. O que eu tenho feito é dizer a minha consciência pra ignorar esse dissabor literário.
Uma médium psicografa uma carta, sendo observada pelo espectro de um homem e uma criança? Não, é só as sombras do fotógrafo e dela mesma...
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