segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

1506) A Whiter Shade of Pale (10.1.2008)





Canções de melodia arrebatadora, arranjo hipnótico e letra enigmática são, como dizia o poeta, “uma alegria para sempre”, um prazer que nunca se esgota. Uma pergunta viva que jamais conseguimos guilhotinar com uma resposta. 

Falei há algumas semanas do “Hotel California” dos Eagles, e hoje andei me lembrando de “A Whiter Shade of Pale”, que o grupo inglês Procol Harum fez tocar nas rádios do mundo inteiro em 1967.

Com um contraponto implacável de um órgão Hammond, no estilo de uma composição de Bach, esta canção fascinou os ouvintes e foi regravada mais de 600 vezes desde então. Influenciou minha geração inteira. 

Vejo pegadas de sua progressão harmônica na canção “Você se Lembra” de Geraldo Azevedo (com letra de Fausto Nilo e Pippo Spera), que aliás faz na segunda parte uma bela fusão com a melodia de “As tears go by”. 

E seu título, “Uma Tonalidade Mais Clara do Pálido”, é parafraseado por Zé Ramalho em “Avohai”: “... de fato existe um tom mais leve na palidez desse pessoal”. Tem certas letras que são assim – ninguém entende, e ninguém esquece.

Era uma das canções favoritas de Lennon e McCartney; foi incluída por Martin Scorsese em seu episódio de “Contos de Nova York”. No Brasil, ouvi-a pela primeira vez no inesquecível curta-metragem “Telejornal”, de Oswaldo Caldeira.

Ouçam aqui:

https://www.youtube.com/watch?v=9SQAdwdTSTM

Sua música gruda no ouvido, envolve e arrasta consigo o ouvinte, como as espirais incessantes do “Bolero” de Ravel. E a letra nos atordoa com suas imagens surrealistas do “salão que vibra e o teto que voa pelos ares”, das “dezesseis vestais virgens”, do cara que pede um drinque e o garçon traz uma bandeja cheia, e a mulher cujo rosto fantasmagórico acaba ganhando um tom mais claro de pálido.

No saite http://www.procolharum.com/awsoplyrics.htm há links para numerosas teorias que buscam explicar os versos da canção. Teorias que sugerem o uso de LSD, uma metáfora da disfunção erétil, ou a hipótese de que toda a letra se passa no Titanic. 

A versão que mais me interessou (http://www.procolharum.com/awsop_burns.htm) é uma comparação da letra da música com a parte final do poema “Tam O’Shanter – A Tale” de Robert Burns, escrito em 1791, sobre um farrista que numa noite de bebedeira vai parar numa velha igreja abandonada onde presencia um sabá de feiticeiras. Segundo o autor do texto, que se assina “Dark Horse”, o letrista Keith Reid teria usado o método “cortar e colar” no poema de Burns, aproveitando frases inteiras e palavras isoladas, e modernizando o contexto. A comparação verso-a-verso dá o que pensar.

A música voltou aos jornais recentemente, quando o organista Matthew Fisher exigiu participação nos direitos autorais – oficialmente, os compositores são o vocalista Gary Brooker e o letrista habitual da banda, Keith Reid. 

Dada a importância do órgão como fio que costura toda a melodia, há uma certa justiça na reivindicação de Fisher, embora seja muito difusa a região em que se misturam “arranjo” e “composição”.



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