(by Alex Howitt)
Ela era uma das três supervisoras trazidas pelo cara que
assumiu a direção do nosso Laboratório. Depois das denúncias, dos escândalos,
das prisões, o governo precisava demonstrar mão firme e investigar aquela
história até o fim. Nós, que
trabalhávamos na parte burocrática e jurídica, tínhamos na verdade uma noção
muito vaga do que acontecia nos andares superiores, onde nunca subíamos. De
qualquer modo, não era da nossa conta. A ordem que o Interventor nos deu foi
continuar trabalhando normalmente, e ficar à disposição deles para explicar
qualquer assunto.
Eu e ela passamos um pente fino num complicado vai e vem
de material biológico em contêiners, com alguns países; uma espécie de mala
direta semanal com amostras, culturas, etc.
Isso nos aproximou, porque eu, que evidentemente não tinha nada a
esconder, mostrei-lhe todas as faturas, notas fiscais, guias de importação,
etc., tudo rigorosamente em dia. Ela começou a brincar dizendo que aquilo
estava tão certinho que devia estar escondendo alguma coisa. Eu fiz uma cara
meditativa e ponderei: “Talvez eles quisessem que este lado aqui estivesse 100%
em ordem, para que ninguém viesse a voltar a atenção para aqui”. “É bem
possível”, disse ela, “aliás, por que você não me convida para jantar?”. Eu
tive presença de espírito para convidar na hora.
Começamos a ir para a cama naquela mesma semana e o
interessante é que o próprio trabalho começou a fluir mais rápido. O novo
diretor me encarregou de assinar tudo que fosse preciso nesse setor de cheques,
empenhos, valores, etc.
Dez dias depois, ela me chamou para jantar na casa dela
pela primeira vez. Avenida Porthos, apartamento 505, disse ela. Era uma área
nobre, mas tinha umas quebradas meio derelitas, e a Porthos era uma delas.
Tranquei o carro, liguei o alarme, apressei-me até o vestíbulo. O elevador
estava quebrado e tive que subir.
Quanto mais eu
subia menos o prédio se parecia com o que eu tinha imaginado. No quinto andar,
parei na porta com o número dela. Bem, só podia ser aquela porta mesmo. Bati, e
ela abriu. Estava vestindo alguma coisa oriental meio exótica, mas que caía bem
nela, como tudo, aliás. Lá dentro estava muito escuro, mas me dava a impressão
de ser um lugar grande e cheio de gente, que não era possível ver devido à
escuridão. A pouca luz vinha de uma espécie de mesa ou de maca, a meia
distância. “Jantar à luz de velas?”, perguntei. “Tem um pouco disso”, disse
ela, afastando-me para me dar passagem e depois trancar a porta, com a luz das
chamas brilhando em suas luvas de látex. “Que pé direito alto tem isso aqui”,
comentei, e só então percebi onde estava.
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