(ilustração: Piotr Przypadek)
Marquinho Bonsai, 28 anos, percussionista da banda new
age carioca Os Outros. Foi
demitido da banda porque, na hora de entrar no palco para o show de estréia da
temporada no Canecão, fumou um baseado tão radical que errou a porta do camarim
e em lugar de ir para o palco saiu para a rua, pegou um táxi e foi para o Baixo
Leblon, onde comeu cinco lasanhas verdes.
Os companheiros de banda o demitiram, não por isso, mas por considerá-lo
dispensável, pelo simples fato de terem conseguido fazer o show inteiro sem dar
pela sua falta.
Ahmed ul-Tahili,
topógrafo marroquino, 46 anos. Dedicou sua vida a uma coleção de
milhares de peixinhos tropicais nos quais implantava chips transmissores de
sinais codificados. Cada vez que dois deles (nos imensos tanques mantidos num
galpão de sua fazenda) se cruzavam a uma distância mínima pré-fixada, um pulso
era captado por um computador central, que selecionava uma palavra e a
adicionava ao imenso poema com que ul-Tahili pretendia concorrer ao Prêmio
Nobel, para o qual chegou a ser indicado três vezes.
Henri Derouard, poeta decadentista francês (1833-1902).
Durante décadas, sua vida consistiu em beber vinho, fumar ópio e escrever um
volumoso diário íntimo onde documentou exaustivamente sua época. Nele, dedicou
milhares de páginas a suas aventuras e fantasias eróticas, e ao seu
relacionamento com pessoas do seu círculo literário, que incluía de Charles
Baudelaire a Stéphane Mallarmé. Em seu
leito de morte, pediu ao sobrinho (que era também seu secretário particular e
confidente) que queimasse tudo – e o idiota obedeceu.
Adam Altamont, texano, herdou e vendeu a indústria de
pré-moldados do pai, e dedicou-se a mapear alfabeticamente ao EUA,
entrevistando em Austin a dona de casa Alberta Allen, depois em Boston o pastor
Bernard Bachman, em Chanute o garoto Clive Cornhill, em Detroit o policial
David Donahue, em Evansville a florista Esther Edison. Indo em sua camionete
rumo a Fort Worth para entrevistar o ator Frank Fullerton, colidiu de frente
com a picape dirigida pelo aposentado míope de origem polonesa Zbigniew
Zebrinski.
Um comentário:
delicioso!
incrível a densidade psicológica dos personagens, desenvolvida em um mero parágrafo.
genial e brauliano, como sempre!
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