Enquanto escrevo estas linhas, nosso astronauta Marcos Pontes já decolou para o espaço há duas horas, e em breve a nave que o conduz estará se acoplando à Estação Espacial. Momento histórico, sim, e acho que devemos comemorar o fato de um brasileiro ir ao espaço. (Alguns mais calejados me sussurram: “Calma, espera pra ver se ele volta inteiro”) Vi matérias eufóricas dizendo que finalmente entramos na maioridade científica, e matérias dizendo: “Nós quem, cara pálida?” Alguns cientistas parabenizaram o astronauta, mas lembraram que a viagem dele está custando o equivalente a um terço do orçamento total do programa espacial brasileiro. É como se o Treze pagasse 100 mil reais à CBF para que Beto jogasse uma partida pela Seleção Brasileira. Seria ótimo, principalmente para Beto, que entraria para a História, e para a CBF, que faturaria uns trocados.
Vendo essa festa, lembro uma canção de Lula Queiroga dos anos 1980, que ao que eu saiba nunca foi gravada, cujo refrão diz: “Eu tô com medo! Sou o primeiro astronauta brasileiro!” A letra de Lula fala das paranóias do astronauta tupiniquim imaginando a quantidade de equipamentos que podem dar defeito de um momento para o outro; mas só tem graça porque ele imagina que a nave é brasileira também. Não é o presente caso. A viagem de Marcos Pontes é toda feita como tecnologia lá de fora. Não representa uma conquista científica; no máximo, é (que ironia) uma conquista econômica, uma prova de que o país é rico e pode pagar para que ele faça uma viagem cara como esta.
Estou sendo cruel com o nosso Flash Gordon. Marcos Pontes é certamente um desses garotos que, como eu, leram aventuras espaciais na infância e sonharam em subir ao céu em foguetes, ver se a Terra é mesmo azul. Eu sonhei com isto aos dez anos, achava que lá por volta do ano 2000 já teríamos bases na Lua, ônibus espaciais indo e voltando, e quem sabe eu, já cinqüentão, faria uma dessas viagens na qualidade de jornalista. Não deu pra mim. Deu pra Marcos Pontes que, pelo menos, está indo realizar experiências científicas que podem ser de alguma utilidade futura.
O que importa é que com a ida dele, garotos brasileiros poderão perceber que nenhum sonho está vedado aos garotos brasileiros. Que não são somente os garotos russos ou norte-americanos que podem sonhar com isto, mas garotos do Brasil, da Bolívia, de Angola, da Tailândia ou do Uzbequistão. As barreiras econômicas existirão sempre, mas tudo que é definido como barreira pode, por definição, ser transposto, contornado ou derrubado. O que há de mais bonito nas conquistas da Ciência é o seu caráter universal. Tudo que a Ciência inventa ou descobre é para todos. A Ciência e o Saber unem; quem separa são a Política e o Poder. Todos têm direito de sonhar, de querer, de tentar conseguir também. Nada é tão democrático quanto a Ciência, e ver um brasileiro no espaço é mais uma maneira de lembrar desta verdade tão simples.
Um comentário:
qua a pior coisa pra um astronauta?
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