Isaac Asimov disse certa vez que, quando a bomba de
Hiroshima explodiu, o mundo inteiro percebeu que estava vivendo numa
ilha-da-fantasia, e que as únicas pessoas que viviam no mundo real eram os
escritores de ficção científica. Isto
não se deve a alguma suposta capacidade dos escritores de FC para “prever o
futuro”. Nem todo escritor de FC está
querendo “prever o futuro” quando escreve.
Alguns querem simplesmente criar uma história fantástica, envolvendo
coisas que não existem e ambientes que não se encontram neste mundo daqui. A possibilidade de estarem “profetizando o
que vai acontecer um dia” lhes pareceria ridícula.
Outros são escritores que conhecem de maneira extensa e
profunda o mundo atual; sabem o que está ocorrendo na tecnologia, na economia,
na política -- ambientes onde
coisas novas acontecem o tempo inteiro, e continuam a acontecer por muito
tempo. Nós é que não sabemos; estamos
preocupados com nossas vidas, nosso trabalho, e os fatos comuns em nossa
cidade. Só tomamos conhecimento de
alguma revolução tecnológica ou política quando ela explode nas manchetes do
mundo inteiro. Alguém aí já tinha
ouvido falar na Al-Qaeda antes do 11 de setembro? Eu não tinha.
Bruce Sterling é um desses escritores que “sabem tudo” que
está ocorrendo no mundo de hoje, e seus livros são rotulados como ficção
científica por mera comodidade editorial, e porque alguns deles ocorrem num
futuro próximo – dez ou vinte anos para a frente. Tirando isto, são livros que fazem um retrato rico e impiedoso de
coisas já latentes no mundo atual. Distraction (1998) é a história de Oscar Valparaiso, um personagem
meio picaresco, surreal, divertido.
Oscar é uma espécie de bebê-de-proveta criado num laboratório
clandestino por traficantes-de-bebês colombianos, e adotado por um astro de
Hollywood. Depois de crescido, ele
torna-se coordenador da campanha de um Senador. O livro começa aí, num período em que os EUA estão entregues ao
caos, depois que a concorrência com a China “quebrou” o país, reduzindo-o à
bancarrota.
Oscar é aquele cara que tem um “jeitinho brasileiro” para
tudo; negociador infatigável, cheio de recursos e de armações, que não desiste
de nada. Tem espírito de marqueteiro de
campanha misturado com investidor na Bolsa. A história ocorre em grande parte
numa Louisiana de pesadelo (o livro é pré-Katrina), e num futuro em que os EUA
estão mais caóticos e entregues às milícias do que a Rússia de hoje. A
destruição do país foi econômica e política, uma implosão de dentro para fora.
É um futuro plausível, surrealista, mais possível a cada ano que passa.
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