sábado, 15 de dezembro de 2012

3057) O Ladrão (15.12.2012)





(Ladrão de Casaca, Alfred Hitchcock)


Há algumas pequenas coisas de que um Ladrão não pode prescindir. Uma delas é uma corda que não se quebre nunca.  Claro que uma corda assim só existe em contos de fadas ou em folhetos de cordel; mas ele precisa ter uma corda fina, de seda talvez, que enrolada ocupe pouco espaço e esticada aguente muito peso. Nunca se sabe de que janela gradeada será preciso descer, pendido; nunca se sabe que dama da corte terá que ser com ela sujigada, conforme o ritual; nem tantas outras façanhas e peripécias possíveis de brotar neste mundo de pesos e de forças.

Outra coisa que um Ladrão de verdade precisa ter consigo é uma bússola.  Não literalmente uma bússola das que se compram em antiquários ou que são exibidas em cosplays steampunks. É a bússola mental, aquela infalível sensação de posicionamento em relação a quatro pontos relativamente fáceis de situar. Muitas vezes, ao fugir no labirinto dos becos, é essencial fazer sempre a melhor opção possível, saber que aquela é de fato a terceira entrada após a quarta esquina à direita, e não morrer numa das muitas armadilhas ali montadas.  Saber em que direção fugir se a coisa apertar, saber o melhor lugar de atacar quando o momento favorecer.

Um talismã talvez seja a terceira coisa, porque um indivíduo assim, mergulhado em atividades delituosas e emperigadoras, deve necessitar de algo que lhe sirva de proteção.  Um objeto magnetizado magnetizando tudo em volta. Uma couraça intrespassável feita de bênçãos pra dentro e maldições pra fora.  

Já que chegamos a níveis mais abstratos, nunca é demais lembrar que um Ladrão precisa ter princípios éticos e morais superiores aos do resto da humanidade, sem, no entanto, menosprezá-la. A natureza especialíssima dos seus talentos e da sua profissão ensina-lhe como se manter num patamar de respeito. Um Ladrão não é um larápio. Um Ladrão é alguém cuja profissão consiste em subtrair algo (um objeto, uma informação, etc.) de um lugar e levá-lo para outro. Dependendo da natureza da coisa a ser furtada e das proteções que a cercam, diferentes habilidades serão exigidas ao Ladrão. E a cada nova técnica dominada, crescem os juramentos e os ritos, para que seus saberes não possam ser usados para ajudar maus propósitos.

E finalmente um Ladrão deve admirar antes de tudo a arte pela arte, a arte por si mesma e só por si, a história bem contada, o golpe bem aplicado, a ilusão bem explorada, o alarme foi dado, e foi ouvido, pôs-se lá o castelo em pé de guerra, e quando tudo passou, cadê o cofre? O cofre sumiu. A informação foi acessada, se multiplicou, se viralizou. Nada é segredo diante de um Ladrão, nada é sagrado ou imunizado contra a sua mão.



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