domingo, 13 de novembro de 2011

2713) Riscando livros (13.11.2011)




(Tom Philips, A Humument, pág. 312)

Diz-se que riscar um livro é uma mistura de falta de educação e desprezo. Não acho. Um livro é um mero suporte de um texto. 

Algumas pessoas o têm como uma distração descartável: o sujeito lê, põe o livro de volta na estante e, daí a alguns anos, manda vender no sebo. 

Para outros, porém, o livro é um objeto de trabalho. Ele não pega o livro para uma leitura casual e sem compromisso, e sim para um enfrentamento intelectual. Pega no livro (inclusive um romance, uma obra literária qualquer) para estudar. Nesses casos, meu conselho é que meta a caneta pra cima, se achar que com isso estuda melhor. 

A caneta serve, como diz Fausto Fawcett, como um contador Geiger que vai assinalando a radioatividade literária dos melhores trechos.

Há pessoas que têm memória visual, e recordam melhor um livro quando visualizam trechos sublinhados, parágrafos destacados com colchetes, anotações feitas nas margens. Minha memória é assim; quando penso naqueles livros que consulto com frequência, é a imagem da página que me vem à memória, com todos os riscos e todas as notas que fiz com meu próprio punho. Se lembro de uma frase que me é muito familiar, sei até se está a página da esquerda ou na da direita; lembro se fica no alto ou na parte baixa da página.

Se você não lembra as coisas assim, não precisa riscar o livro, mas, se riscá-lo desse modo o ajuda a marcar melhor as coisas na memória, meu conselho é que o faça. 

Quando releio um livro, releio primeiro as partes sublinhadas, porque sei que ali estão os trechos que nas leituras anteriores achei mais importantes. Não que eu concorde, necessariamente, com o que está dito; mas porque aquilo concentra melhor as idéias do autor, sejam elas o que forem. 

Alguns leitores desenvolvem códigos próprios. Diz-se que Guimarães Rosa criou o código “m%” (“meu, cem por cento”) para indicar trechos com os quais se identificava especialmente.

Costumo fazer conexões entre trechos do livro, quando vejo a mesma idéia repetida em pontos diferentes. Se vejo na pág. 150 algo que tem tudo a ver com um trecho importante da pág. 82, coloco: “ver pág. 82” ao lado, e voltando à primeira coloco “ver pág. 150”, incluindo aí quantas referências houver. Daqui a 20 anos, quando precisar consultar o livro, não preciso ficar procurando aqueles trechos durante uma tarde inteira. 

Também aconselho criar um índice remissivo no final, registrando os assuntos importantes e as páginas em que aparecem. Muitos livros trazem esses índices, mas nem todos registram os assuntos que interessam à gente. Rabisco um livro para poupar tempo a um leitor de daqui a dez anos, que por coincidência serei eu mesmo.






2 comentários:

Ruy disse...

—:> Concordo com vc, Braulio. Eu tbm "risco" os livros que leio, e tenho verdadeiro apreço por eles. Livro sem uma 'marquinha' que seja nas margens, nas entrelinhas, sem um sublinhadinho é como mulher mal comida, cara, vai malhar vc pelo resto da vida.
Saudações heréticas diretamente de Jacacity,
Ruy.

Maranganha disse...

A ideia de "ler como enfrentamento intelectual" é bem interessante. Parece que o leitor se depara com um livro de armadura sobre um cavalo branco e uma lança, e você está do outro lado, com uma lança em mãos pronto a rabiscá-lo todo. rsrs