terça-feira, 21 de dezembro de 2010
2432) O Homem Bicentenário (21.12.2010)
Este filme de Chris Columbus se baseia na noveleta homônima de Isaac Asimov, que ganhou em 1976 o Prêmio Nebula de ficção científica. É a história de um robô (interpretado por Robin Williams) que ao longo de dois séculos evolui passo a passo até se transformar, se não num ser humano biologicamente idêntico (o que seria quase impossível) pelo menos em alguém tão semelhante a uma pessoa que, nas cenas finais, é assim reconhecido pelo governo. Os numerosos romances e contos de Asimov sobre o “Ciclo dos Robôs” mapeiam essa evolução, começando com os desajeitados robôs de corpo metálico, com aparência de escafandristas, até os andróides com visual humano e interior cibernético. Asimov se serviu disto para fundir suas histórias de robôs com seu outro ciclo, o da “Fundação”, um império galáctico cujos protagonistas humanos (ficamos sabendo depois) eram, em grande parte, meros andróides evoluídos dessa forma.
É interessante notar que o conto de Asimov é de 1976, quando os EUA comemoravam os 200 anos de sua independência, e a palavra “bicentenário” estava por toda parte. Ao invés de comentar os 200 anos transcorridos, Asimov fez uma projeção para os próximos 200 anos. É possível ver na história de Andrew, o robô, um processo de conquista de liberdade, cidadania e direitos humanos que de certo modo ecoa o dos cidadãos norte-americanos após a Independência. A certa altura do filme, o robô (cuja habilidade como artesão o torna milionário, encorajado pelos seus proprietários, uma família liberal) diz que quer comprar sua liberdade. (Como será que se diz “alforria” em inglês?) O patrão lhe diz que ele é livre para fazer o que quiser, e ele retruca que quer um atestado formal de liberdade, explicando: “Milhões de seres humanos morreram para conquistar isso, então deve ser algo muito importante, e eu gostaria de experimentá-lo”.
A noveleta e o filme, portanto, são percorridos por um subtexto político evidente. Um robô é alguém governado de maneira inflexível pelas Três Leis da Robótica, que o obrigam a obedecer os humanos, protegê-los e proteger a si próprio. Já um ser humano é protegido pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, que à época da publicação da noveleta era quase bicentenária também, e que está integrada de forma indissolúvel ao espírito da Revolução Norte-Americana de 1776 e da Revolução Francesa de 1789. Um robô, como um escravo, é alguém que quer deixar de ter apenas deveres para ter também direitos, para ser também um cidadão. Um robô se torna um ser humano não apenas quando conquista tecidos, músculos e glândulas artificiais, mas quando entende, conquista e pratica a cidadania, a liberdade. Até mesmo a contraditória liberdade de, podendo ser imortal, preferir ser como os humanos, sentir dores, envelhecer, morrer. Ele se torna um cidadão por ser, como dizia Edmund Burke ao Parlamento britânico sobre os colonos da América, “incapaz de barganhar a jóia íntima de sua alma”.
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