sábado, 6 de novembro de 2010
2394) “Waking Life” (6.11.2010)
Este filme de Richard Linklater, de 2001, passou meio despercebido nos cinemas, mas vem adquirindo um perfil “cult” de lá para cá. Caso o leitor não esteja ligando o nome à imagem, trata-se daquele desenho animado que mostra o tempo todo pessoas envolvidas em discussões filosóficas sobre a existência, o ser, o nada, os sonhos e a consciência humana. Vários amigos meus o acham chatíssimo. Eu não acho. Já tinha visto várias partes dele na TV a cabo, e esta semana vi-o inteiro por duas vezes. Cada vez gosto mais. Por que? Bem, em primeiro lugar porque uma parte considerável da minha vida foi e é dedicada a pensar e discutir a respeito da existência, do ser, do nada, etc. e tal. Não o faço por intelectualismo ou esnobismo, faço porque me parecem questões mais interessantes do que saber se vai chover amanhã ou quem vai ganhar o Oscar.
Linklater também não pode ser rotulado como o típico intelectual chato. Ele dirigiu o divertido Escola de Rock com Jack Black e o romântico Antes do Amanhecer com Ethan Hawke e Julie Delpy. Sua filmografia é variada e interessante, e Waking Life tem uma porção de sacadas que deram certo, fazendo dele um filme que merece atenção. A primeira sacada foi transformá-lo num filme de animação. Se ele tivesse a mesmíssima história que tem, com as mesmas cenas e os mesmos diálogos, mas fosse um filme comum, encenado com atores, aí sim, talvez virasse um filme chato. O realismo fotográfico de atores e ambientes daria uma certa aridez às discussões, que ficariam parecidas demais com papos-de-mesa-de-bar. Linklater filmou tudo com atores. Depois do material editado, contratou equipes de animadores e entregou a cada uma delas uma sequência do filme, para que eles cobrissem as imagens com desenhos. Isso deu ao filme uma aura onírica, adequada ao enredo (um rapaz perdido num sonho, do qual desperta no interior de outro sonho, e assim sucessivamente). A colagem de estilos e de traços, além de evitar a monotonia, nos dá exatamente a sensação de estar saltando de um sonho para dentro de outro.
Linklater é um fã de Philip K. Dick (depois ele viria a utilizar esta mesma técnica de animação superposta para filmar O Homem Duplo, de Dick), e é ele próprio quem aparece numa das últimas sequências, jogando pinball e contando um episódio (real) da vida do escritor. A dificuldade em distinguir entre a realidade e o sonho é um tema constante na obra de Dick. O diretor o transforma num tema entre outros, já que as discussões são bem variadas. Há também umas sequências musicais bem interessantes. Não sei por que, tenho uma sensação inexplicavelmente onírica quando chego sozinho num lugar e vejo pessoas desconhecidas dançando, sem que ninguém perceba minha presença, e sem que eu saiba o que estou fazendo ali. Nessas horas, penso que estou sonhando, e mais, penso que estou retornando a um sonho conhecido, que eu já havia sonhado muitos anos atrás. Por que? Não sei. Por isso vejo esses filmes.
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Um comentário:
Por indicação de minha avó, prof. Dorziat, conheci a sua obra e o seu blog.
Muito me agrada em saber que apenas uma geração me separa de um expoente da literatura conterrâneo.
Deposito minha profunda admiração, e a certeza dos frutos que seu exemplo espalha.
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