segunda-feira, 20 de outubro de 2008

0610) O Rock, a Direita e a Esquerda (3.3.2005)




Para muita gente estes termos designam dois partidos políticos, mas na verdade eles expressam algo que vai muito além da política. São visões do mundo que impregnam tudo, da Estética à Religião. 

Tentando resumi-las da maneira mais sintética possível, eu diria que a Direita acredita que as Elites devem governar as Massas, e a Esquerda crê que as Massas devem governar as Elites. 

Claro que, numa arena inflamada como a da política, termos como “elite” e “massa” acabam ganhando conotações pejorativas ou auto-glorificatórias.

Uma das classificações mais divertidas do pensamento da Direita e da Esquerda é a de Quaderna, o protagonista do Romance da Pedra do Reino de Ariano Suassuna, comentando as brigas ideológicas de seus mestres Clemente e Samuel:

“De modo semelhante, tomavam, furiosamente, partido em tudo. A Sociologia era da Esquerda, e a Literatura fortemente suspeita de direitismo. O “riso satírico e a realidade” eram da Esquerda, a “seriedade monolítica e o sonho”, da Direita. A Prosa era da Esquerda e a Poesia, da Direita; mas, mesmo ainda dentro do campo da Poesia, tomavam partido, pois a lírica era considerada “pessoal e subjetiva, e portanto direitista e reacionária”, enquanto que a satírica, “social e moralizante, didática” era considerada progressista e da Esquerda.

A Natureza, com “a luta pela vida, dura e cruel, com a selvageria, a desordem, a sobrevivência do mais forte e as marcas que ainda guardava do Caos e do negrume”, era da Direita. A cidade, “organizada, baseada no progresso, no trabalho e na máquina”, era da Esquerda.

Do ponto de vista social, o sexo masculino, mais forte, dominador e explorador do outro, era da Direita, e o sexo feminino, explorado, fraco, ressentido e revoltado, da Esquerda. Mas, do ponto de vista do gosto, o sexo masculino, sóbrio e despojado, era da Esquerda, enquanto o feminino, com o amor pelos tecidos e pelas jóias, era da Direita. E assim por diante, em tudo e por tudo”. (Folheto 34)

É uma sátira, claro, mas distinções deste tipo podem ser multiplicadas a tal ponto que parecem pertencer a um movimento instintivo da mente humana. Servem para qualquer coisa. 

Se os padrinhos de Quaderna fossem versados em rock-and-roll, por exemplo, o elitista Samuel diria que o rock é de Esquerda, porque expressa o primitivismo musical das massas urbanas, o nivelamento-por-baixo da arte de combinar letra e música, e a rebeldia-sem-causa de adolescentes incomodados com a autoridade paterna. 

E o marxista Clemente diria que o rock é de Direita, porque expressa os interesses das mega-corporações da indústria fonográfica, a lavagem cerebral de-cima-para-baixo promovida pelos meios de comunicação, e a promessa de enriquecimento fácil desviando a juventude da verdadeira luta política. 

Os Beatles (comportadinhos, condecorados pela Rainha) são de Direita, e os Rolling Stones (sujos, mal-educados, agressivos) são de Esquerda. 

E assim por diante, em tudo e por tudo.





Um comentário:

Olga Costa disse...

É interessante essas distinções... Os beatles fumaram antes de receber a condecoração da rainha, disseram que eram mais famosos que jesus e fizeram uma música que inspirou um assassinato! A culpa foi do Brian, que achou que podia controlar os caras, principalmente um tal de Lennon :)