(Werner Heisenberg e Niels Bohr, em 1934)
A Interpretação de Copenhague é o título de uma peça teatral que depois foi
filmada. O título se refere a um item
importante na história da Física Quântica.
Hoje em dia, tudo virou quântico. As pessoas têm um coach quântico, afirmam terem vivido
“momentos quânticos”, e não vai demorar muito a gente encontrar em alguma
barraca um "pastel quântico" – que pode conter carne moída, ou não.
A física quântica é mais um capítulo complicado na relação
entre o Universo Físico e a Mente Humana. Um casal formado por duas entidades
fascinantes, mas que aparentemente não foram feitas uma para a outra.
A Interpretação de Copenhague é resultado dos
experimentos e das verbalizações conjuntas do alemão Werner Heisenberg, que
entre outras façanhas propôs o chamado “Princípio da Incerteza”, e o
dinamarquês Niels Bohr, um dos pioneiros da nova concepção da matéria e da energia.
Muita coisa maluca na Física decorre, ao que parece, do
fato de que existe uma aparente descontinuidade nas leis do Universo. Abaixo de um certo patamar sub-atômico, as
coisas físicas (luz, massa, matéria em geral, etc) não se comportam como aqui
no mundo dos objetos grandes. Têm suas próprias leis; como se um limiar houvesse
sido transposto. O mundo sub-atômico é outro país, sob outra constituição,
outros códigos.
Reconstituir, entender e utilizar esses códigos é o
objetivo dos físicos quânticos.
Um dos elementos principais da física quântica (atenção, coaches!) é o fato de que nesse mundo
sub-atômico a gente nunca tem certeza se algo vai acontecer ou não, e pode se
basear apenas em probabilidades e percentagens.
Isso é complexo? Nem tanto. Qualquer brasileiro ou
brasileira que você aborde ao acaso numa avenida central de uma grande cidade
às três horas da tarde poderá, se você o(a) convencer a aceitar um café e uma
hora de papo, mostrar que tem uma idéia bem aproximada do que é certo, do que é quase inevitável, do que bem
pode acontecer, do que é duvidoso,
do que não acontece nem que a vaca tussa.
Todo mundo é assim? Claro que não. Tem gente que só
cultiva certezas, gente para quem, no universo, só existem dois tipos de
coisas: as impossíveis e as obrigatórias. Mas é uma maneira pouco quântica de
abordar o mundo real.
Einstein, ao que se diz, nunca engoliu a Teoria Quântica,
porque ele procurava certezas científicas à maneira clássica: provas experimentais
irrefutáveis, amparadas por linguagens auxiliares, como a Matemática ou a
Lógica. Daí a frase famosa que lhe é atribuída: “Deus não joga dados”. Einstein
é o anti-Mallarmé, o poeta que disse: “Um lance de dados jamais abolirá o
Acaso.”
É fácil prever o que acontece no mundo físico? Seria, se
conseguíssemos reunir toda a informação necessária a respeito de um fenômeno em
vias de se desencadear. Mas essa proposta faz sentido? “Toda a informação
necessária” deveria ser levado ao pé da letra? Até que ponto?
É como se imaginássemos todos estar vivendo num mundo
sólido, e de repente experimentos nos provassem que certos patamares do mundo
são líquidos, ou gasosos. A matéria se comporta de outra maneira.
Uma boa avaliação das teorias de Heisenberg e Bohr está no blog de José Tadeu Arantes, em linguagem bastante acessível, do qual, aliás, pesquei a imagem que ilustra este artigo:
Parece que um aspecto essencial da Teoria Quântica é o de
que muitos estados físicos são ambíguos, admitem dois resultados mutuamente excludentes, mas conseguem conciliar os dois num estado provisório de
indefinição.
A imagem clássica para isto é uma moeda girando. Vai dar
cara ou coroa? No estado ambíguo da moeda, há meio-a-meio de probabilidades, e
a moeda, girando, deve ser descrita matematicamente, com essa honestidade; pode
ser isto e pode ser aquilo. A moeda-que-ainda-não-caiu é real.
O momento crucial, na ciência, é o momento da medição,
através dos aparelhos do laboratório. Existe algum processo subatômico sendo
desencadeado no interior daquelas máquinas. Tudo acontece no interior dos
átomos. Num mundo invisível. Não é a
mesma coisa que estar na janela acompanhando com a luneta o deslocamento de um
planeta qualquer. O mundo quântico é invisível. Só o aparelho consegue
acessá-lo, por um breve instante – e “bater uma chapa”, como se dizia antigamente.
É no que se vê nessas chapas (e em outros sistemas de
medição, etc etc.) que os cientistas baseiam suas especulações.
Criou-se com isto a “Teoria dos Muitos Mundos”, segundo a
qual cada evento sub-atômico que pode resultar em SIM ou NÃO gera dois
universos, e de acordo com a lei das probabilidades num deles eu saí de casa
naquela noite, e no outro não, resolvi ficar lendo. Dois universos divergentes
brotam a partir dessa simples escolha, e de outra, e de milhões de outras.
Milhões de universos que cada um de nós produz em poucos minutos, nas decisões
entre o levantar da cama, o escovar os dentes, o tomar café, o vestir-se. Como
dizia Lewis Carrol, somos capazes de encarar dez coisas impossíveis antes de
tomar o café da manhã.
Um conto recente de Ted Chiang, em seu livro Exhalation (a sair pela Editora
Intrínseca), reinterpreta isso de uma maneira diferente, e que me pareceu mais
sólida. Chiang postula em seu conto ("Anxiety is the Dizziness of Freedom") a existência de um futuro próximo em que há
máquinas (uma espécie de notebooks)
onde a partir do momento de sua ativação estamos em contato com um universo
divergente onde eu posso conversar com o “Braulio” dessa outra linha temporal
(por texto, ou por “viva voz”).
Um dos muitos aspectos previstos por Chiang, nesse quadro
de possibilidades, é a responsabilidade que temos em cada gesto. Será que
apenas por escolher a camisa azul, e não a camisa amarela, estarei gerando uma
infinidade de universos inúteis?
Para Chiang, os fenômenos quânticos atuam apenas no nível
subatômico, e suas principais interferências no mundo macro, onde vivemos com
nossos livros e nossos automóveis, se dão apenas nas mudanças no nível dos
átomos, que ele amplia de maneira convincente. Mas nós, os nossos corpos, a
nossa vida cotidiana, nós não geramos novos universos quando vestimos a camisa
vermelha e deixamos de vestir a verde. O universo continua um só.
Nós, nesta
vida corpórea daqui, não somos quânticos. Nossos átomos e demais sub-partículas
é que geram esses universos múltiplos. E quando um deles se produz nós vamos
juntos. Nem sequer o gesto da bifurcação temporal compete a nós: fica a cargo
de algum quark sem personalidade.
Como se o mundo inteiro pudesse sofrer um abalo, uma
interferência desorientadora, somente porque num certo dia um minúsculo
aglomerado de vírus no organismo de um animal qualquer foi comido por uma
pessoa qualquer num mercado qualquer de uma cidade grande.
Um comentário:
O livro Matéria Escura, de Blake Crouch, fala da hipótese de vários universos paralelos, que passam a existir dependendo das nossa decisões. Esse Multiverso infinito seria a matéria escura... Acho que vc gostaria de lê-lo. Abraços.
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