sábado, 24 de julho de 2010
2302) Eternas Ondas (24.7.2010)
O que é uma onda, uma nova onda? É o mesmo oceano de sempre, movimentando-se de uma maneira diferente. Na década de 1960, dois movimentos tiveram nomes idênticos.
A Nouvelle Vague francesa foi um movimento de jovens cineastas, reunidos em torno da revista Cahiers du Cinéma, que queriam descartar o pomposo cinema francês de pretensões industriais, realistas, hollywoodianas no mau sentido, e criar um cinema ágil, de câmara na mão, muita improvisação, politicamente próximo à esquerda, e mais devedor dos filmes B do que dos filmes A de Hollywood.
A New Wave britânica foi um movimento de jovens escritores de ficção científica, reunidos em torno da revista New Worlds, que queriam fazer uma fusão entre a literatura de vanguarda da época e a pulp fiction norte-americana.
O mais interessante é que estes escritores eram provavelmente fãs dos filmes franceses, porque escolheram o termo New Wave como uma referência direta. Era como se dissessem: “Queremos fazer na FC inglesa o que Godard, Truffaut e companhia estão fazendo no cinema da França”.
A Nouvelle Vague era uma tentativa de inseminar o cinema francês (que os jovens críticos do Cahiers consideravam quadrado, artificial, incapaz de falar do momento presente) com a agilidade do cinema norte-americano, seu pragmatismo (contraposto à oratória vazia), sua impudência e amoralidade, seu cinismo juvenil. E fazia isso buscando no filme B norte-americano a vitalidade que o filme A francês não tinha, nem como linguagem, nem como experiência de vida.
A New Wave britânica entrou num vácuo entre as duas ficções científicas cultivadas nas Ilhas: o “scientific romance” tradicional, intelectual e ambicioso (H. G. Wells, Olaf Stapledon, C. S. Lewis, Aldous Huxley, George Orwell, etc.) e a pulp fiction barata, imitada das revistas dos EUA.
No imenso espaço disponível entre essas duas faixas, surgiu uma literatura consciente das vanguardas lidas na época (Joyce, Samuel Beckett, William Burroughs, os Surrealistas, Kafka, Borges, Herman Hesse, Italo Calvino, etc.) e que pretendia juntar esse experimentalismo formal (e relativismo ideológico, explorando um Universo desconhecido, vazio de valores absolutos, pronto para ser explorado e redefinido) à volúpia narrativa da pulp fiction tradicional, sua imaginação vívida, pululante de arquétipos, mostrando o Inconsciente pessoal e coletivo à flor da página.
Em Paris e Londres, de 1955 em diante, dois grupos de artistas jovens da velha Europa iam buscar na indústria cultural norte-americana (o filme B, os “pulp magazines”) uma vitalidade rústica que lhes faltava, e temperavam essa vitalidade com o intelectualismo de onde provinham – no caso dos cineastas franceses, com tinturas de Marx; no dos escritores britânicos, com mais tinturas de Freud.
Imagino que até hoje pouca gente estudou em conjunto essas duas Novas Ondas, suas influências recíprocas, seus canais de comunicação. Eis uma boa tese de Mestrado à espera de ser escrita.
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