sexta-feira, 24 de abril de 2009

0996) O código dos albinos (26.5.2006)



Uma minoria pela qual ninguém se interessa são os albinos. Os negros, índios, homossexuais, deficientes físicos, crianças super-dotadas... todas estas minorias contam com a simpatia implícita das legislaturas e dos meios de comunicação. Contra os albinos, contudo, parece existir um conluio difamatório, ou na melhor das hipóteses uma conspiração de silêncio. Isto é curioso, por ser uma espécie de preconceito de cor às avessas. Não sou albino, mas, como branquelo convicto, já fui muitas vezes vítima de discriminação em lugares públicos – como a praia, por exemplo. Se os negros se queixam de preconceito, os muito brancos também têm seus motivos para insatisfação. Precisamos acabar com a ditadura cultural dos bronzeados.

Enquanto isto não acontece, contam os albinos com a Organização Nacional pelo Albinismo e Hipopigmentação (N.O.A.H.), entidade que defende os interesses dessa turma, e que foi à imprensa há pouco para protestar contra o filme O Código Da Vinci, onde um dos vilões é um monge albino que assassina pessoas a mando da ordem religiosa a que pertence. Michael McGowan, diretor da NOAH, disse que este é o 68o. filme, desde 1960, a mostrar um albino num papel negativo. Como exemplos recentes ele citou o personagem de Bosie em Cold Mountain e os gêmeos assassinos de Matrix Reloaded. Ao mesmo tempo, ironizou a desinformação dos responsáveis por filmes como A Firma e Letal Weapon, onde são mostrados albinos (que têm uma notória deficiência visual) como atiradores de elite. McGowan afirmou que, nas duas últimas décadas, 2004 foi o único ano em que não apareceu nenhum filme com um personagem albino apresentado sob uma ótica negativa.

Os albinos parecem ameaçadores, talvez, porque seu desconforto à luz tem algo de noturno e vampiresco. Para os leitores de ficção científica não há como não lembrar dos Morlocks, os mutantes subterrâneos de H. G. Wells em A Máquina do Tempo. Seres que o Viajante do Tempo, em seu primeiro encontro, descreve como “aquela Coisa desbotada, obscena, noturna”, produto de milênios vividos nas profundezas da Terra.

Para nós, nordestinos, tudo isto parece esquisito, porque os albinos mais conhecidos que temos são aquela dupla de músicos que gênio que recreiam nossos ouvidos e nossa imaginação há décadas: o paraibano Sivuca e o alagoano Hermeto Paschoal. Aos nossos olhos, nada têm de ameaçadores. Suas barbas alvíssimas e seus rostos rosados lhes dão a aparência bonachona de um Papai Noel à paisana. O sentimento que sua visão nos desperta é de instintiva simpatia, mesclada à curiosidade que sentimos por quem foge um pouco à medianidade. Ambos guardam um ar de mistério por trás daquelas lentes meio escuras, meio fundo-de-garrafa. Um mistério de quem tem algo de alquimista, bruxo, duende, mas um mistério que irradia luz, que vem do lado dos mistérios criativos, de onde brotam a vida e a beleza.

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