O leitor já ouviu falar em Ted Nelson? Provavelmente não, embora isto não o impeça de daqui a alguns minutos estar sentado ao computador, clicando links e baixando arquivos. Nelson foi um dos pioneiros da World Wide Web, embora ele próprio renegue tudo isto hoje. Nascido em 1937, é da geração que criou “isso tudo que está aí”, mas, pelas ironias habituais da História, não é da geração vencedora. Ele inventou a palavra “hipertexto” e foi o criador do Projeto Xanadu, um mirabolante programa de hipertexto através do qual ele pretendia indexar através de links toda a informação disponível em texto no mundo inteiro. É chamado por uns “o pai do hipertexto”, “o maior visionário do mundo dos computadores”, etc. Para outros, é um “gênio falido”, “um sonhador que não deu certo”.
Material sobre Nelson pode ser encontrado por toda parte. Há uma coleção de frases suas em: http://xanadu.com.au/ted/TN/WRITINGS/TCOMPARADIGM/tedCompOneLiners.html. Nelson observa, argutamente, que em geral “tecnologia” é alguma coisa à qual você tem que se submeter, em benefício de alguém. E diz: “Hipertexto não é tecnologia, é literatura. Literatura é toda a informação que nós agrupamos e preservamos, primeiro em forma de livros e jornais e revistas, e agora em forma de filmes e gravações e CD-Roms e o mais que vier. O modo como a literatura do futuro será organizada irá definir até que ponto a humanidade poderá ter acesso a ela e compreendê-la. Isto não são questões que devam ser deixadas aos meros tecnologistas”.
Quanto à WWW de hoje, ele diz: “O HTML é precisamente o que tentávamos evitar: links que caem o tempo inteiro, links que conduzem apenas numa direção, citações cuja origem não se pode rastrear, nenhum controle sobre as versões de um documento, nenhum controle sobre direitos”. Nelson atuou numa fase crucial da criação deste mundo vídeo-texto-digital que hoje está aí. Teve idéias brilhantes que foram copiadas, imitadas ou transformadas por outros. Estabeleceu para si próprio objetivos gigantescos e intelectualmente ambiciosos, apenas para ver-se ultrapassado por sujeitos com projetos mais imediatistas e pragmáticos, os quais acabaram criando a WWW que temos hoje.
Seu destino parece um pouco o de Moisés, que guiou o povo hebreu à Terra da Promissão e morreu quando estava já chegando; mas na verdade é algo mais cruel do que isto. É o destino de quem ajudou a conceber uma Revolução, viu-a crescer mais depressa do que imaginava e fugir ao seu controle, e percebeu que de líder passou bem depressa a mero coadjuvante e, depois de algum tempo, a uma mera nota ao pé da página de um livro que imaginara ser seu. Mais ou menos (imagino) o que se deu com Trotsky na Revolução Russa (ultrapassado por Lênin e Stalin), e com a guinada vanguardista dos Beach Boys (eclipsados pelo Sergeant Pepper’s dos Beatles). Qualquer sujeito assim tem motivos para ficar meio amargurado.
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