segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

0762) Esconderijo urbano (27.8.2005)




(City Hideout)

Já comentei aqui nesta coluna (“A bênção da solidão”, 23.9.2004) um filme de guerra em que um prisioneiro, não agüentando mais a cela superlotada em que vivia, prendia num canto da parede um pedaço de pano e se escondia atrás dele, para ter a sensação de estar sozinho. Era uma demonstração dessa necessidade patética que todos nós temos (ou se não todos, “somente os normais”, como diria Nelson Rodrigues) de em algum momento nos isolarmos da multidão, da presença incômoda dos olhares alheios.

Pois bem: como diria o pessoal das Organizações Tabajara, “seus problemas acabaram!”. O saite “Cool Hunting” anuncia uma singela invenção intitulada “Esconderijo Urbano” (City Hideout), projetada pelo estúdio belga OOOMS. Trata-se de uma caixa de metal desmontável, como essas caixas de papelão que usamos para embalar material. O sujeito pode levá-la na mala do carro, ou, se não for a uma distância muito grande, pode levar embaixo do braço, pois não é muito pesada. Se em qualquer momento ele for acometido pelo “pânico da multidão” é só colocá-la no chão, junto da parede, armar com ela um cubículo de um metro e meio de altura, entrar ali dentro e puxar a tampa sobre si. Vista do lado de fora, parece apenas mais uma dessas caixas metálicas usadas para proteger instalações elétricas ou telefônicas.

É pena que esta coluna não seja ilustrada, etc e tal, mas dê uma olhada no endereço: http://www.coolhunting.com/archives/2005/06/how_to_disappea_1.php#more. O saite comenta que a caixa, por outro lado, possui algumas fendas horizontais pelas quais o ocupante poderá olhar para fora sem ser percebido, o que para alguns pode ser uma forma de compensação. Ver sem ser visto! Tem gente que daria um olho para poder desfrutar deste prazer.

Os modernos escritórios das corporações substituíram as salas individuais pelos tabiques separatórios. São salas sem teto, por onde vazam conversas, ruídos, toques de telefone. Reduz a solidão, mas acaba com a privacidade. Entrar num desses escritórios é deparar-se com um enorme vão, com teto muito alto, e um labirinto de paredes pré-moldadas, coberto por um enorme “balloon” comunitário onde se misturam os diálogos, telefonemas e reuniões de todo mundo que trabalha ali. Indivíduos mais introspectivos não suportam esse tipo de zum-zum-zum, de colméia em polvorosa. Vão ao banheiro de meia em meia hora, só para poder se fechar atrás de uma porta.

Minha teoria é de que assim como na questão dos grupos sanguíneos existem “doadores universais” e “recebedores universais”, existem pessoas que necessitam constantemente do estímulo psíquico da presença e da atenção de outras pessoas, porque recebem energia com isto; e existem pessoas para que essa presença é debilitante, porque “doam” energia, e precisam se isolar de vez em quando para recuperar a normalidade. Mergulhá-las num ambiente coletivo 24 horas por dia é como matá-las de hemorragia.





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