Minha percepção da natureza do Prêmio Nobel foi contaminada para sempre pela leitura de um interessante livro de Irving Wallace, The Writing of One Novel (1968). Nele, Wallace rememora, vinte anos depois, todo o seu trabalho de vários anos no romance The Prize (1962), um thriller policial tendo o Nobel como pano de fundo, que foi filmado depois por Mark Robson, com Paul Newman no papel principal.
A idéia para o romance veio
quando Wallace estava na Suécia, em 1946, fazendo reportagens para revistas dos
EUA. Ocorreu-lhe entrevistar um figurão científico sueco que continuava a ser
um defensor público de Hitler, mesmo após a derrota e a morte deste. No curso
da entrevista, o dr. Sven Hedin revelou ser um dos jurados permanentes do
Prêmio Nobel. O jornalista sentiu cheiro
de assunto, pressionou o professor, e extraiu alguns depoimentos tão francos
que chegam perto da ingenuidade. O dr.
Hedin (hidrógrafo, cartógrafo, autor de livros populares de viagens pelo
mundo), afirmou fazer parte dos comitês julgadores de Química, Física e Literatura.
Wallace perguntou-lhe por que
alguns autores de grande estatura não tinham ganho o Prêmio Nobel. Hedin perguntou
quais. Wallace sugeriu o nome de Máximo Górki, e ele disse: “Ah, ele morreu
muito cedo. O nome dele era cogitado de vez em quando. Cedo ou tarde acabaria ganhando.”
Wallace perguntou por H. G. Wells. A resposta: “Um autor menor, muito
jornalístico”. E Somerset Maugham, então
no auge do sucesso? “Muito popular, sem
maior expressão”. E o que dizia o doutor sobre James Joyce? O dr. Hedin pareceu
perplexo: “James o quê?”.
Segundo Irving Wallace, o prêmio
ficava às vezes dependente do entusiasmo de um único jurado, como foi o caso de
Hjalmar Gullberg, que traduziu para o sueco toda a poesia de Gabriela Mistral e
lutou por ela até conseguir o prêmio. Ou no sentido oposto, como na campanha do
dr. Carl David Wirsen contra Tolstoi, Ibsen e Strindberg, que ele detestava por
diferentes razões.
No campo da ciência, Wallace
confirma que no Prêmio Nobel de Física concedido a Einstein em 1921 a Academia
faz menção específica à descoberta do efeito foto-elétrico, sem citar a Teoria
da Relatividade, com receio de que esta viesse a ser desmentida. A impressão de
espanto e de incerteza diante da nova cosmologia proposta era muito forte.
Tudo isto, é claro, são fofocas
de 1946, que Wallace pode ter usado para dar verossimilhança ao seu livro de
espionagem. Não importa. Qualquer prêmio concedido por um júri é uma tentativa
de transformar o qualitativo em quantitativo. É como a diferença entre esportes
olímpicos. Nos esportes como basquete, futebol, vôlei, há uma contagem de
pontos obtidos de forma inequívoca e quem faz mais desses pontos ganha. Em
outros, como a ginástica, a contagem é subjetiva, mas fica distribuída por um
corpo de jurados.
Isso faz com que toda reunião de
prêmio artístico (inclusive festivais de música, cinema, teatro) tenha um pouco
aquele clima de “Doze Homens e Uma Sentença”, discussões acaloradas entre
jurados, com pressões e concessões de todos os lados, até que o resultado final
é proclamado como se fosse o resultado de uma decisão unânime. Uma tentativa de
criar um equilíbrio dinâmico de doze subjetividades, para valer como uma forma
de objetividade.
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