(ilustracao de Abigail Larson)
H. P. Lovecraft, mestre das histórias de horror, foi um
sujeito de perfil conservador até quase a caricatura. Ele dizia que era um
homem do século 18 perdido no século 20.
Suas opiniões literárias, contudo, são em geral bastante ajuizadas. Numa carta de 2 de outubro de 1928 para sua
amiga Zealia Brown-Reeed Bishop, ele comenta a moda do fluxo de consciência
(“stream of consciousness”) que vinha tomando conta da literatura.
HPL reconhece o fato, uma relativa novidade na época, de que
“nossas mentes estão cheias, o tempo todo, de milhares de linhas de imagens e
de idéias irrelevantes e dissociadas; e nossos atos na verdade são determinados
pela soma total desses farrapos heterogêneos e inconscientes, mais do que por
uma única linha de idéias conectadas que nós, publicamente, reconhecemos em
virtude de sua posição no nível superior da consciência.” Ele louva a maneira
como a literatura tenta reproduzir no texto esse entrechoque de elementos quase
aleatórios, e vê James Joyce (na prosa) e T. S. Eliot (na poesia) como os
principais expoentes dessa tendência. (Mais adiante, ele a define melhor ao
enumerar os nomes de E. E. Cummings, Hart Crane, Aldous Huxley, Wyndham Lewis,
Dorothy Richardson, os Sitwells, D. H. Lawrence, Virginia Woolf, Gertrude
Stein, Kenneth Burke, Ezra Pound e Marcel Proust).
HPL levanta a questão: uma tal escrita pertence ao domínio
da arte literária ou do mero registro psicológico de impressões? Ele dá
generosamente o benefício da dúvida aos escritores, dizendo: “Os métodos
extremos destes autores transcendem, sem dúvida, os limites da verdadeira arte,
embora eu acredite que eles estão destinados a produzir uma poderosa influência
sobre a arte propriamente dita. A arte literária, creio, deve continuar
aderindo à prática de registrar fatos exteriores [à consciência], em ordem
consecutiva; mas de agora em diante deve perceber as motivações complexas e
irracionais desses acontecimentos, e deve se abster de atribuir-lhes causas
simples, óbvias e artificialmente racionalizadas.”
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