Este
romance curto de Roberto Bolaño (1996) saiu pela Companhia das Letras e depois
(a edição que tenho) na coleção da Folha de S. Paulo de capa dura, vendida
nas bancas. O autor explica, numa nota inicial, que é uma expansão do último
capítulo de seu A Literatura Nazista na América, coletânea de contos sobre
escritores imaginários, um exercício meio borgiano em que Bolaño imagina toda
uma fauna de nazistas, fascistas e simpatizantes da direita em geral,
produzindo poesia, romance e até mesmo ficção científica no continente
americano. O autor dedicou-se a expandir a história daquele último personagem,
transformado aqui em Carlos Wieder, tenente da força aérea chilena, torturador,
serial killer, que se infiltra como espião em grupos de poesia de vanguarda.
Essas
biografias fictícias são o espaço ideal para Bolaño desenvolver sua prosa,
jornalística no que este termo tem de melhor. Descrições breves e vívidas, com mergulhos ocasionais e surpreendentes na subjetividade do narrador, que na
maior parte do tempo está apenas reconstituindo e comparando suas próprias
lembranças e as lembranças alheias. Como em Os Detetives Selvagens (http://bit.ly/WnNhCq), Bolaño monta o mosaico
do personagem de fora para dentro; não temos acesso à consciência de Wieder, e
na verdade pouquíssimas falas suas são reproduzidas. Vemos o monstro pelo lado
de fora, pelos relatos de como ele cruzou na vida de numerosas pessoas. Se bem
que o narrador de Bolaño ousa descrever (sob o pretexto de estar supondo, estar
imaginando como as coisas aconteceram) até mesmo um dos mais arrepiantes crimes
do chileno.
4 comentários:
Na mesma linha também a personagem Max Aue, do romance "As Benevolentes", de Jonathan Littell. O nazista culto, capaz dos maiores sadismos e cultor do humanismo mais elevado. Casado, mas deixando-se seduzir vez por outra por homens, como se toda a sua vida fosse como uma "matroschka", essas bonecas russas ocas contendo outras bonecas no seu interior. A mim pareceu um personagem artificial, de falsa densidade, um teia de símbolos: um arquétipo burguês para consumo de um público específico, que se pretende de gostos refinados. Não li o livro de Bolaños, então não posso me manifestar se nele se dá este tipo de leitura. Todo caso, não consigo deixar de tecer paralelos entre estas literaturas de tipos incomuns e a literatura de fim de século como a de Huysmans, com suas personagens auto-centradas, obsessivas e amorais. Literaturas autorreferentes, nadando em metalinguagens que se pretendem cifradas, para poucos. Taí, vou visitar Bolaños.
Procure "A literatura nazista na América", um conjunto de biografias fictícias de autores imaginários. Não sei se foi traduzido aqui.
Procurarei. Obrigado pela dica.
Comprei. Em espanhol mesmo, não encontrei traduzido. Mais uma vez, obrigado.
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