sábado, 27 de março de 2010

1833) O novo funcionário (23.1.2009)



Dias atrás um novo funcionário público passou a ocupar, nos EUA, o cargo que a imprensa chama de O Homem Mais Poderoso do Mundo, e muitos ocupantes acreditam. Barack Obama é um personagem interessante, mas, antes de falar dele, falemos do cargo, porque à primeira vista Obama desmente tudo que vivo afirmando sobre a Presidência de uma República. A coisa que mais horrorizava as pessoas quando as repúblicas começaram a substituir as monarquias era a impessoalidade dessa forma moderna de governar. As pessoas estavam acostumadas a dois sistemas – a Substituição Sanguinolenta (Fulano matava Sicrano e tornava-se rei) ou a Eternização Bocejante (soberanos que passavam 40, 50 anos no trono, como D. Pedro II ou a Rainha Vitória). Esse negócio de haver uma substituição de quatro em quatro anos (diziam) nem dá tempo da gente se acostumar com a cara e os cacoetes do governante.

A República Presidencialista (sistema que acho muito inferior ao parlamentarismo) é uma tentativa de salvar um pouco desse espírito monárquico em que tudo gira em torno de um nome, um rosto e uma vontade. O Presidente é, mitologicamente, um rei de paletó e gravata. (Ariano Suassuna, que cultiva um monarquismo estético, muito diferente do monarquismo político, fala de sua decepção na infância quando viu o Rei da Bélgica vestindo terno, e sem coroa.) A República é um esvaziamento de toda a pompa icônica e simbólica que cerca a monarquia. Esteticamente, toda monarquia é católica e toda república é protestante.

E aí passamos para um patamar superior do mito que cerca os presidentes em regimes presidencialistas. É o mito de que quem toma as decisões é ele. Como um rei. Ora, nem os reis eram voluntaristas desse jeito, nem mesmo um rei faz tudo que quer (OK, alguns imperadores faziam – Nero, Calígula, Heliogábalo...) De vez em quando aparece um presidente querendo criar, mas na verdade presidente não cria, presidente escolhe. Governar é escolher entre as opções A, B, C, D e E que lhe são oferecidas por ministros e generais (e olha que nem sempre as escolhas são tantas).

Obama está sendo saudado como Salvador da Pátria, como foi Lula aqui no Brasil, por sindicalistas, povão, setores de esquerda, etc. O candidato sempre chega com um discurso de mudança. (São raros os momentos tão positivos que permitam a alguém fazer campanha dizendo “votem em mim, não vou mudar nada, garanto que fica tudo como está”.) Depois que bota o pé lá dentro, o eleito tem uma reunião a portas fechadas em que lhe mostram a real situação do país, e o que acontecerá ao país (e a ele, e à família dele) se ele cumprir as promessas de campanha. Não sei se é bem assim, sei que o candidato sai dessa reunião transformado. O Lula de 2002 era um, o de 2003 em diante era outro. Saudemos Barack Obama, um cara simpático e provavelmente bem intencionado. Saudemos esse mulato sorridente que nos traz tantas esperanças, porque de agora em diante talvez nunca mais o reencontremos.

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