domingo, 31 de janeiro de 2010

1594) O caso Isabella (22.4.2008)




Dias atrás escrevi aqui sugerindo outra linha de investigação para o caso da morte da menina Isabella, em São Paulo. Propus um hipotético suspeito: alguém com acesso ao prédio, como um operário da construção. Não porque achasse que esta era a solução, mas como alternativa à linha adotada desde o começo pela polícia e pela imprensa – a de que a menina teria sido morta pelo pai e pela madrasta. Na verdade não acreditei muito no meu imaginário “Zezinho”, que ao ser surpreendido pela garota dentro do apartamento a teria matado e atirado pela janela. Os indícios iniciais sobre o casal davam o que pensar, e os mais recentes parecem (parecem!) confirmar a culpa dos dois.

Minha preocupação é menos a de encontrar os culpados do que a de preservar os inocentes. Há pessoas que se deixam empolgar pela indignação moral diante de um crime e, quando é apontado o primeiro suspeito, ficam todas assanhadas, querendo linchá-lo no meio da rua. Não duvido que teriam feito isto com Alexandre Nardoni e Anna Jatobá, se a polícia os deixasse sair sem escolta. Enormes injustiças já foram praticadas aqui pela impaciência em achar um bode expiatório cujo apedrejamento público dê aos apedrejadores a sensação de que são pessoas dignas e respeitáveis, fazedoras de justiça. E não são. São pessoas transtornadas, preconceituosas, que se deixam levar por idéias preconcebidas sobre tipos de pessoas que são criminosos em potencial. Nos EUA, enforcaram-se negros em árvores e postes elétricos durante muitos anos. Bastava que um deles fosse acusado de alguma coisa.

O nosso Brasilzinho tão democrático não é muito diferente. Se a imprensa faz um pouquinho mais de pressão, todo mundo sai à rua de cabo de vassoura em punho, disposta a ser o carrasco de alguém que mal teve tempo de provar sua inocência. O caso da Escola Base é o mais notório – educadores foram acusados de pedofilia, foram depois inocentados, mas o mal estava feito, e a vida deles está arruinada até hoje. A Rede Globo, a revista IstoÉ e os jornais “Estado de São Paulo” e “Folha de São Paulo” já foram condenados a pagar indenizações às pessoas acusadas injustamente (ao que parece, houve apelações e os processos continuam correndo na Justiça).

Crianças indefesas, de famílias miseráveis, são mortas como Isabella todos os dias. Os defensores de crianças não se manifestam porque se pressupõe que numa favela ou numa periferia a vida é assim mesmo. É uma triste rotina. Quando a vítima é de classe média, o caso muda de figura – parece que só então trata-se de um ser humano; poderia (pensam os moralistas) ser um dos nossos próprios filhos. Não nego que a morte de Isabella é trágica, e deve comover a todos. Toda vez que penso nesse assunto também sinto uma revolta. Mas é assim que somos – escolhemos um bode expiatório cujo perfil nos convém, despejamos toda nossa indignação em cima dele, e depois vamos cuidar da nossa vida, que ninguém é de ferro.

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