Quem os profere geralmente nem sabe o mal que está causando. Elogios precoces podem abortar uma carreira; elogios imerecidos podem transformar um sujeito, à sua revelia, num pária entre seus pares. O mundo está cheio de jovens escritores que pediram a um escritor veterano um prefácio elogioso, conseguiram-no (em geral porque o veterano achou mais simples livrar-se logo do chato do que ficar inventando desculpas), e acreditaram piamente nos louvores perfunctórios que o medalhão alinhavou em meia dúzia de linhas.
Certa vez, quando tinha metade de minha idade atual, eu estava tocando violão com amigos num bar de Olinda. Toquei e cantei sem parar durante uma hora, e quando fiz a pausa regulamentar para molhar a garganta ouvi um bebum dizer numa mesa lá do canto: “Vocês vejam só o que é o mundo! A gente olha pra um cabeludo desse, sujo, desgrenhado, feio, mal vestido, e nem é capaz de imaginar que ele cante tão bem!”
Foi um elogio, não foi? Eu, pelo menos, assim considerei. Também experimentei o oposto simétrico deste caso. Eu acabara de lançar um livro, e numa festa encontrei um amigo que me deu um abraço e disse: “Mas Braulio! Como é que um cara inteligente, espirituoso, culto e bem informado como você escreve um livro tão sem graça!” Resolvi considerar, no todo, como outro elogio.
Quando Guga ganhou o Torneio dos Campeões em Lisboa, em 2000, e tornou-se o melhor tenista do mundo, ao agradecer o troféu ele elogiou seu adversário no jogo final, André Agassi: “Precisamos aplaudir Agassi, que foi um cara muito importante no tênis mundial”. Ao ouvir a tradução, Agassi botou uma cara de quem está pensando: “Se era pra me elogiar nestes termos, nem precisava ter se incomodado”.
Um elogio pode ser pior do que um insulto. Diz uma piada antiga que um Bobo da corte disse um dia ao Rei: “Um pedido de desculpas pode ser pior do que uma ofensa”. O Rei disse: “Você tem dez minutos para provar isto, senão será guilhotinado”. O Bobo ficou por ali, deu um tempo, e quando viu o Rei distraído aproximou-se por trás e aplicou-lhe uma “dedada” vigorosamente exploratória. O Rei deu um pinote: “Êpa, caba safado, que negócio é esse?!” E o Bobo: “Desculpe, Majestade! Pensei que fosse a Rainha!”
Certos críticos, no afã de elogiar, deixam o elogiado numa tremenda saia justa. Dizem, por exemplo: “O CD de Fulano de Tal está mil anos-luz à frente da obra do decadente Caetano Veloso”. É só o que basta para que, imediatamente, dez milhões de caetanistas coloquem Fulano na lista negra por um crime que o coitado (talvez até um caetanista ele próprio) não cometeu.
O elogio gratuito, exagerado e oco da imprensa mundana foi satirizado no título do CD dos Titãs A Melhor Banda de Todos os Tempos da Última Semana, uma radiografia simples e que diz tudo da banalidade de julgamentos críticos no universo pop.
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