segunda-feira, 29 de março de 2010
1840) Rushdie e os tribunais (31.1.2009)
(Salman Rushdie)
O escritor Salman Rushdie, que anos atrás foi ameaçado de morte e perseguido por fanáticos islâmicos por causa de seu livro Os Versos Satânicos, envolveu-se recentemente numa disputa judicial que ainda é uma conseqüência remota desse período perigoso de sua vida. Como se sabe, Rushdie, que é cidadão britânico nascido na Índia, recebeu proteção da polícia inglesa nessa época, e durante vários anos teve que viver escondido, clandestino, mudando de endereço com frequência, protegido dia e noite por guarda-costas.
Agora, Rushdie acabou de ganhar uma causa judicial contra um desses guardas, Ron Evans, autor do livro On Her Majesty’s Service: My Incredible Life in the World’s Most Dangerous Close Protection Squad. Ao que parece, Evans, que era apenas o motorista do grupo, apresenta-se no livro como um policial armado do esquadrão, chama Rushdie de “mau e arrogante” e diz que certa vez os policiais ficaram tão de saco cheio com ele que o trancaram num armário embaixo da escada e foram tomar cerveja num pub. Tudo isto, de acordo com a sentença, era mentira. Aliás, Evans saiu da polícia depois de receber nove sentenças por desonestidade.
O editor e o “ghost-writer” contratado por Evans para escrever o livro admitiram, após a sentença, que grande parte da história contada era falsa, e comprometeram-se a corrigir os erros. Os réus foram condenados a pagar as custas do processo, mas o escritor não quis indenização para si próprio, e afirmou que isto deveria encorajar outras pessoas a exigir retratações sem exigir pagamentos: “Me parece pouco convincente a idéia de que receber uma enorme soma de dinheiro irá fazer bem a sua reputação. Isto significa apenas que seus advogados são melhores do que os advogados da outra parte. Por outro lado, ver a Corte afirmar que certas coisas publicadas pelo seu oponente são mentirosas é algo que tem peso. Nunca procurei perseguir ninguém pelas suas opiniões pessoais. Contudo, fatos são fatos, e mentiras são mentiras, e acho que a lei existe para permitir que fique bem claro o que é uma coisa e o que é a outra”.
Rushdie foi perseguido pelo fanatismo religioso muçulmano. Agora, depois que os aiatolás retiraram a “fatwa” ou condenação contra ele, tem que quebrar lanças contra o fanatismo comercialesco do Ocidente. Como o Deus que manda aqui é o Dinheiro, qualquer indivíduo que conviveu com alguém famoso quer escrever memórias escandalosas, revelando detalhes da vida do ex-patrão, ou inventando, quando não tem o que revelar. É o mordomo de Roberto Carlos, o segurança de Lady Di, a camareira da atriz A, o secretário do cantor B... Todo mundo finge que tem segredos escabrosos para contar. No mínimo faz um “retrato sem retoques” que vai agradar aos desafetos do famoso e fazer a festa na redação das revistas de fofocas. Pensando bem, não custava nada Rushdie ter exigido uma indenização e empregar esse dinheiro no combate aos Parasitas da Fama.
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