segunda-feira, 22 de junho de 2020

4592) Contracapa de Zoom (22.6.2020)



(foto: Rodrigo Buendía, Ecuador)



&  não tem ninguém mais perigoso do que um medroso armado

&  a gente acaba ficando com aquele olhar de tédio de um músico que toca em 10 casamentos por semana

&  a esta altura só falta mesmo uma história de vampiros submarinos combatendo zumbis-bomba de Marte

&  minha mente é um ônibus vazio fazendo a circular numa cidade em chamas

&  não sei o que é pior, ficar me revirando na cama ou ficar cochilando no computador

&  um peixe numa gaiola cheia dágua

&  vou parar de dar murro em ponta de faca e começar a rebater bala com a testa

&  nem tudo que é possível vale a pena poder, e nem tudo que é improvável vale a pena descartar

&  é preciso fazer alguma coisa antes que a palavra “brasileiro” se transforme em gíria pejorativa

&  já que ficar em repouso está fora de cogitação, me deixem pelo menos achar uma órbita mais condizente

&  as bibliotecas estão cheias de biografias de 700 páginas de gente que ninguém sabe mais quem foi

&  qualquer fenômeno da natureza pode ser interpretado, com bons argumentos, como bom augúrio ou como premonição funesta

&  às vezes é melhor um fracasso retumbante do que um sucesso que passa despercebido

&  vou por aqui, dando aquele cochilo de soldado na guerra

&  toda utopia do ponto de vista de “A” é distopia do ponto de vista de algum possível “B”

&  vivo exausto como um sonâmbulo que sofre de insônia

&  é difícil trabalhar quando o WhatsApp faz Pínnn! numa média de dez vezes por lauda

&  um corvo empunhando uma pena de corvo e escrevendo um poema

&  gente suja vestindo roupa limpa

&  o sujeito está quietinho e em paz na cela dele, aí vem o indulto de Natal e o obriga a ir beber com os parentes

&  se eu pedir ao garçom uma chícara de xá, será que ele questiona?

&  a memória é um quadro a óleo, onde nada se apaga, mas se esconde, pintando por cima

&  chega uma hora em que a gente nem tem saco de parar nem de limpar o para-brisa

&  sou inocente do que me acusam e culpado do que me absolve

&  não se deve confundir um acerto com um acordo, nem um acordo com um contrato

&  “A gente se vê por aí” tem um complemento implícito: “...se não depender da minha vontade”

&  existe um ponto inicial em que dor e prazer ainda não se bifurcaram

&  o amor é uma espécie de açúcar para disfarçar o gosto real das coisas

&  uma epidemia é apenas a epiderme de um monstro maior

&  contra o flu, pelo menos, eu já sou vacinado

&  nem toda aldeia tem por objetivo virar cidade

&  em política, a gente acredita com o inconsciente, e depois manda a consciência procurar justificativas

&  a lata não tem obrigação de ser cúmplice do lixo

&  viver é jogar a moeda pro alto um bilhão de vezes até cair o outro lado

&  por aí está cheio de brutamontes truculentos que quando se escandalizam parecem uma libélula

&  quando eu vejo uma foto coletiva de ministério penso logo na expressão “flora intestinal”

&  quem me dera um furacão com controle remoto

&  nem adianta pedir dinheiro emprestado a um Banco em chamas

&  um canguru não faz distinção entre a bolsa e a vida

&  é impossível passar adiante um conhecimento; só se pode mesmo sacolejar a cachola de quem necessita

&  quem tem saliva ainda não está com sede

&  um filósofo de cavanhaque e gola rendada precisa de muito impulso para sobrevoar nosso presente

&  o homem não é apenas um caniço pensante, tem horas em que não passa de um inseto crente que zumbir é falar grosso

&  quando amainar o pandemônio desta pandemia nem vamos ter tempo para computar as perdas e comparar as reflexões

&  às duas da madrugada passa na minha rua aquele maluco falando aos berros com o celular de si mesmo

&  mais o peito me palpita, mais tenho o palpite de que qualquer pulsação é bom sinal

&  é foda ir dormir pensando quem serão os mortos de amanhã

&  gente aí se lamentando que a geladeira está vazia, ora essa, vende a geladeira, amigo

&  a democracia brasileira é um hímen complacente e consegue manter as aparências mesmo depois que elas desaparecem de todo

&  e nestes momentos brota em nosso coração aquele sentimento inexprimível chamado A Revolta Do Grão De Areia Contra A Ventania

&  gastaram tanto dinheiro inventando uma bomba de nêutrons, quando bastava um vírus besta

&  certas mulheres têm olhos baixos de freira, e quando eles se erguem tudo é bordel

&  com tempo e atrito bastante, todo cubo se transforma em esfera

&  a esta altura já existem lugares onde não mais pisarei













2 comentários:

Jeferson disse...

cinquenta e quatro, passou de uma boa ideia, foi Ótimo!!!!!

Fraga disse...

CLAP, CLAP, CLAP!
E não sisquece de tuitar tudo! Abraçãozão.