(Minha contribuição ao gênero chamado Dark Quarks – contos de terror em duas frases.)
1) Na esperança de engravidar, ela recitou preces, fez
simpatias, preparou um berço, e toda noite ia olhar para ele. Uma noite havia
alguém lá.
2) O chão cedeu durante a fuga e ele afundou até a cintura numa lama
espessa. Quando tentou nadar seus braços
ficaram presos.
3) Quando a luz do elevador apagou, ele ficou aborrecido. O medo só começou quando ouviu um rangido
profundo e o elevador começou a mover-se lateralmente, cada vez mais depressa.
4) Ao enfiar o pé na bota esquerda e amarrar os cadarços
experimentou com prazer aquela sensação protetora. Ao enfiar o outro, sentiu a
ferroada na sola do pé.
5) Ele morava sozinho, e levantou no meio da noite para
atender as insistentes batidas na porta da frente. Somente ao acender a luz da
sala viu o braço descarnado que começava a se enfiar por baixo da porta.
6) Ele
percebeu que tinha se perdido na caatinga, e desceu do jipe para se orientar
pelas estrelas. Quando o jipe arrancou sozinho, começou o rumor na mata.
7) Morando à beira de um bosque, sempre achou que seus
inimigos eram os lobos. Até o dia em que fugindo de um lobo caiu dentro de um
poço vazio e aí começaram seus problemas.
8) O poema saiu inteiro, num jato,
como se já viesse pronto, uma, duas páginas, os dedos voando no teclado,
perfeito. “Deseja salvar as alterações?” “Não”.
9) Brincando no parque, a garotinha foi seguida por um homem
mal encarado. Assustada, pediu carona no carro de uma moça, respirou aliviada,
mas a motorista parou o carro na esquina e o homem entrou no banco traseiro.
10)
A festa do casamento foi divina, a viagem agradável, o hotel da lua-de-mel era
um paraíso. Mas ela não esperava que na suíte nupcial estivessem quatro amigos
do marido, fumando e bebendo, à espera.
12) O quarto à noite começou a se encher de mosquitos formando uma nuvem alongada, quase sólida. A nuvem esvoaçou até perto da cama e desligou o ventilador para ficar mais à vontade.
13) Ao ouvir o terceiro sinal, ajeitou o black-tie, o smoking, flexionou os dedos e dirigiu-se para o palco, pressentindo rumor de casa cheia. Chegando ao proscênio, deparou-se com mil e duzentos caiapós armados e pintados para a guerra.
14) Uma ventania súbita e um vozerio na rua o levaram à janela, de onde avistou a praia, seca, numa extensão de centenas de metros. Procurou o mar com os olhos e o viu no horizonte, erguendo-se até a metade do céu, como uma naja armando o bote.
3 comentários:
Muito bons os microcontos. Dá aquela vontade de continuar a história de algum jeito.
Parabéns! Adorei lê-los.
Adoravel😍parabens quero mais historias assim👏💖
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