Entre 1999 e 2000, o escritor Paul Auster coordenou um programa de rádio nos EUA onde ele lia colaborações enviadas pelos ouvintes. Ele pedia histórias verídicas, com a condição de que fossem histórias que desafiassem “nossas expectativas sobre o mundo”, episódios que revelassem “as forças misteriosas e desconhecidas que movem nossas vidas”.
O livro resultante chama-se True Tales of American Life, e foi publicado no Brasil como Achei Que Meu Pai Fosse Deus (Companhia das Letras, 2005). É um livro para se ter por perto, abrir ao acaso, ler uma historieta e ficar pensando.
Fiz isto hoje e me deparei com “Land of the Lost”, enviado por Erica Hagen, da Califórnia. Diz ela que alguns anos antes de ser professora trabalhou como atriz, e apareceu num seriado de TV chamado “Land of the Lost”. No episódio em questão, a protagonista era uma garotinha, e Erica fazia o papel da mesma personagem, já adulta, que viajava de volta no Tempo e aparecia a si mesma para avisar que estava em perigo.
Anos depois disto, ela resolveu fazer um passeio até Burma, na Malásia. Conheceu Rangun, Mandalay e outras cidades. Um dia, estava visitando um templo budista e entabulou conversa com um cavalheiro local, muito culto, que falava excelente inglês. Ele lhe serviu de cicerone no templo, explicando-lhe detalhes da cultura local.
Ao chegar a hora do almoço, o cavalheiro convidou Erica a almoçar em sua casa. Chegando lá, ela foi apresentada à família. E a neta do cavalheiro, uma menina de oito ou nove anos, declarou de repente: “Eu conheço você!”
Foi lá dentro e trouxe um daqueles antigos aparelhinhos chamados TeleVisex, uma espécie de binóculos onde se colocam discos de papelão com fotos estereoscópicas. Um desses discos era sobre o seriado “Land of the Lost”, e lá estava Erica, numa das cenas do filme.
O dono da casa tinha trabalhado como marinheiro num navio mercante. De passagem por Nova York, comprou aquele aparelhinho para a neta. Anos depois, Erica resolve ir a Burma, vai ao mesmo templo que o avô da menina, os dois travam amizade, ele decide convidá-la para almoçar, ela aceita... O relato dela acaba assim:
“O mais espantoso de tudo foi a reação daquela família. Não ficaram nem um pouco surpreendidos. Uma vez que tinham minha foto, acharam perfeitamente natural que o Destino acabasse por me trazer até a sua porta”.
Este assunto pode ser encarado de muitas maneiras, e escolherei uma.
Existem dois tipos de pessoas. Para o primeiro tipo, os fatos, os acontecimentos da vida, são linhas divergentes, que partem do mesmo ponto central e se afastam sem parar. Estas pessoas acreditam, por exemplo, que o Universo foi criado com um Big Bang. Sob esta premissa geométrica, só é possível que duas linhas se cruzem se uma força externa, visível, interferir sobre elas.
E o segundo tipo acredita (com Teilhard de Chardin) que “tudo que se eleva para as alturas converge para um mesmo ponto”.
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