Um amigo meu, sertanejo por convicção e machista por conveniência, costuma afirmar: “No dia em que me virem lavando um prato, podem ir procurar meus “pussuídos” na lata de lixo, porque alguém cortou e jogou lá!”
Eu não sou radical a este ponto, embora confesse que lavar pratos não é uma prioridade para meus momentos de lazer. Prefiro pagar a alguém para fazê-lo, mas também pago ao eletricista, ao encanador, ao pedreiro. Não é uma questão de sexo ou gênero; é uma questão de tarefa chata.
Os homens, que não são bestas, passaram séculos fazendo uma lista de tarefas chatas e combinando entre si que toda mulher que nascesse sofreria uma lavagem cerebral desde a época das fraldas até ficar convicta de que aquilo era obrigação sua. Funcionou.
Funcionou com a arte de cozinhar, por exemplo, até que recentemente os homens resolveram vestir o avental e aparecer em programas culinários na TV-a-cabo, ensinando a fazer estraga-onofre e outros pratos sofisticados. (Acho que agora são as mulheres que estão promovendo uma lavagem cerebral às avessas, mas isto é assunto para outro dia)
Não acho que lavar pratos seja menos masculino do que escovar os dentes. É uma tarefa chata, mas aí eu digo como Clint Eastwood ou Charles Bronson: “It’s a dirty job, but someone has to do it”.
Qualquer sujeito que teve que se virar sozinho na época de estudante aprendeu uma série de truques. Estudei um fenômeno chamado Ciclo de Cristalização dos Resíduos. E aprendi que prato, ou você lava logo depois de comer (quando os resíduos, ainda aquecidos, não se cristalizaram e aderiram à louça ou ao vidro), ou então bota na pia – de molho. Cobrir os pratos com água abundante dilui os resíduos, reduzindo em 93% o tempo de esfregação subseqüente para os pratos, e em até 48% o das panelas.
As panelas são um capítulo à parte, pois a comida submetida a temperaturas de cocção passa por transformações químicas intensas, as quais quase que soldam as substâncias à parede interna do receptáculo. Lavar uma panela horas depois, sem deixá-la de molho, significa escalavrar as unhas no bombril, e obter resultados que uma doméstica profissional desmoraliza com uma gargalhada.
Lavar liquidificador também requer minúcias de neurocirurgião. (Naquele tempo eu simplesmente chacoalhava água lá dentro, enxugava, e guardava de volta) Lavar talheres é um saco. O cara pega a esponja, esfrega uma daquelas faquinhas serrilhadas para churrasco, e sai dali com um corte no dedo, sendo que de noite vai ter que tocar violão e contar lorotas num teatro. Não pode nem se desculpar: “Eu estou tocando mal porque cortei o dedo, lavando pratos...”
Lavar pratos, companheiros, é como escovar os dentes. Já que tem que fazer, que se faça de maneira vigorosa, eficaz, definitiva. Acabou de almoçar? Não esquente: bote o prato de molho e vá ver um jogo na TV, enquanto a água desmancha as cadeias peptídicas (ou sei lá o que acontece quando um prato está de molho).
2 comentários:
As mulheres, que não são bestas, passaram séculos fazendo uma lista de tarefas perigosas e combinando entre si que todo homem que nascesse sofreria uma lavagem cerebral desde a época das fraldas até ficar convicto de que aquilo era obrigação sua. Funcionou.
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