Ganhe quem ganhar, perca quem perder, um dos grandes prazeres de uma Copa do Mundo é admirar os gols inesquecíveis que se desenham em segundos mágicos diante dos nossos olhos. Vai longe o tempo em que a gente escutava as Copas no rádio e tinha que esperar meses até passar no Capitólio o “Canal 100” mostrando como tinha sido o gol! Hoje, vemos a História se traçando em tempo real, e isto não tem preço.
O que faz um gol ser mais bonito do que outros? Depende muito. No dia em que escrevo estas linhas, vi um gol memorável do brasileiro Deco (Portugal) contra o Irã. Figo avançou pela quina esquerda da área, rolou a bola para Deco, que estava desmarcado e poderia ter invadido a área, mas preferiu descair o corpo para a esquerda e mandar um petardo de pé direito no ângulo direito do coitado do goleiro. Sabe aqueles chutes em linha reta? Pois é. Em termos de potência lembrou um gol que o Koné, da Costa do Marfim, fez ontem contra a Holanda: avançou pelo miolo, ao receber combate derivou para a direita, depois derivou de novo, clareou, e de fora da área mandou um foguete lá em cima.
Já o gol bem trabalhado é uma obra de natureza diversa. Até agora, vi dois que foram perfeitos: o último gol da Espanha (Fernando Torres) na goleada de 4x0 sobre a Ucrânia, e o segundo da Argentina (Cambiasso) no 6x0 que impôs à Sérvia-Montenegro. Gols onde a bola rolou de pé em pé, com o time todo avançando, rodando, tocando de primeira, deixando o adversário tonto até o chute final, indefensável, à queima-roupa. É o tipo do gol que depende de oito ou dez toques, e se tivesse havido o menor erro ou a menor hesitação em cada um deles o gol não teria acontecido. É um prêmio à rapidez de raciocínio, e à mistura perfeita entre a jogada bem ensaiada e a exatidão no improviso.
Falar em jogada bem ensaiada, o primeiro gol da República Tcheca nos EUA foi o tipo da jogada que o time traz no bolso desde o vestiário. A defesa recuperou a bola, o armador esticou um lançamento de 30 metros na ponta direita, o ponta correu, avançou, levantou a cabeça, e fez um cruzamento perfeito para o grandalhão Koller (2 metros e 2 cm, e sósia de Nalbert do vôlei) testar com violência para o fundo da rede. Parecia um clip feito em computação gráfica, para ensinar aos jogadores: “Tentem fazer assim”. E lembrou um pouco os gols da Copa de 58 em que Didi esticava para Garrincha, ele driblava, cruzava, e Vavá empurrava para dentro.
Falar em jogadas iguais, alguém reparou que o gol de Gerrard (Inglaterra), o segundo contra Trinidad-Tobago, foi um xerox do gol de Kaká contra a Croácia? Recebeu a bola da lateral direita, livrou-se do adversário girando para dentro, e da intermediária, quase na meia-lua, mandou a bola de chapa, de pé esquerdo, no canto superior do goleiro. O de Kaká foi um pouco mais para o meio e para a frente. Acho que ninguém percebeu a semelhança porque um foi no gol à direita e o outro no gol à esquerda das câmaras. Mas a Arte é uma só.
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