Peço emprestado o título de um filme de Luís Buñuel para batizar, neste minúsculo artigo, um dos conceitos mais perigosos da arte do século 20.
O Fantasma da Liberdade é a falsa idéia de que quanto mais liberdade temos, melhor. Como diria Augusto dos Anjos: “Ilusão trêda!”.
O mundo ocidental experimentou tantos séculos de despotismo, imperialismo, tirania, fascismo, nazismo, ditaduras e todas as suas variantes, que a Liberdade acabou parecendo, num contexto de regimes autoritários e sanguinolentos, um valor absoluto. Hoje em dia você pode falar mal até de Jesus Cristo, que passa. Mas se chegar num jornal e disser que a Liberdade não é um valor absoluto, como eu estou dizendo agora, corre o risco de ser crucificado.
Pois tragam os centuriões! Estou pronto a me sacrificar pela Verdade. Mas primeiro deixem-me apresentar as provas da defesa.
Prova A: o Verso Livre. Um belo dia, algum Einstein da literatura teve a idéia de dizer: “Vamos abolir essa besteira de métrica e rima, essas coisas que é preciso estudar! Viva o verso livre, e viva o verso branco!” Entendo a intenção de quem fêz isto, e concordo que foi um avanço. Mas serviu de pretexto para que milhares de incompetentes achassem que fazer poesia era escrever qualquer coisa.
Prova B: a Pintura Abstrata. Durante séculos, só era pintor quem soubesse pintar figuras: gente, cavalos, árvores ou navios. Aí um belo dia, alguém disse: “Pintura não é pra mostrar nada. Bastam as cores, as tintas, as formas.” Esta revolução nos deu Kandinsky e Jackson Pollock, mas nos deu também uma legião de borra-botas que acham que basta lambuzar uma tela com qualquer coisa, em nome de liberdade.
Prova C: o Rock de Garagem. Surgiu nos anos 80 como uma resposta da garotada à complexidade barroca e aos excessos de pretensão sinfônica do rock progressivo. Do punk rock em diante, os garotos começaram a dizer: “Para fazer rock não é preciso cantar bem, não é preciso tocar bem. Rock é atitude.” Em poucos anos este lema tinha degenerado em: “Para fazer rock não é preciso cantar, não é preciso tocar, rock é qualquer coisa.” O corolário disso todo mundo sabe: meia dúzia de garotos pulando, soltando uivos inarticulados, espancando instrumentos amplificados ao máximo, e dizendo que estão exercendo sua “liberdade criativa”.
Prova D: o Cinema Experimental (e seu clone, a Video-Arte). Para combater o comercialismo de Hollywood e o intelectualismo do cinema-de-autor, inventou-se um cinema sem interpretação, sem roteiro, sem fotografia, sem produção, sem direção. O seu lema parece ser : “A idéia na câmara, e as mãos na cabeça”, ou seja, aponta-se a câmara em qualquer direção, registra-e qualquer coisa, e o resultado é “arte”. Por que? Porque, para muita gente hoje em dia, “tudo é arte”.
Eu poderia juntar outros exemplos: a Escrita Automática, a Música Aleatória, as Instalações Conceituais, etc. Mas o espaço acabou, e continuo amanhã.
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