terça-feira, 1 de abril de 2008

0342) O movimento dos planetas (24.4.2004)



(Três fotos de Vênus sobre o Sol)

Há quem se comova com a beleza das obras de Arte; eu me comovo com a beleza das obras da Ciência. Achar a beleza na Arte, afinal de contas, é de uma obviedade entediante. Se um Autor fica virando noites a fio para fazer com que um filme, um poema, uma música, um quadro, etc. seja considerado “belo”... ora diabo, mais cedo ou mais tarde alguém vai acabar achando mesmo. Mais sutil e mais despercebida, para mim, é a beleza que nasce de descobertas científicas ou tecnológicas que pretendiam ser apenas uma polaróide de um aspecto do Universo físico que nos cerca. Pensem na tabela periódica dos elementos. Pensem na microfotografia de tecidos vivos, de moléculas minerais. Pensem no estudo geométrico dos cristais-de-neve e das funções fractais. Como diria Biliu de Campina: “beleza pura”.

E por trás das obras da Ciência existem comovedoras histórias humanas, tanto quanto nos salões da Arte. Vejam por exemplo este recente episódio envolvendo a observação astronômica e a moderna tecnologia digital. Em 6 de dezembro de 1882, astrônomos do Observatório de Lick, que estava sendo construído no Monte Hamilton, na Califórnia, reuniram-se sob a coordenação do Prof. David Peck Todd para fotografar uma passagem do planeta Vênus diante do Sol. Devido ao alinhamento da posição dos astros, passagens deste tipo são relativamente raras, e, como Vênus está muito distante, passam despercebidas. (A Lua é muito menor que Vênus, mas como está muito próxima de nós provoca um eclipse toda vez que passa diante do Sol)

O Prof. Todd e seus ajudantes, usando a tecnologia da época, tiraram um total de 147 negativos em placas de vidro, documentando a passagem do planeta de encontro ao disco solar. Ele certamente sabia da possibilidade de que estas imagens sequenciais pudessem vir a ser “animadas” um dia, pois já em 1874 Pierre Jules Janssen havia inventado o seu “revólver fotográfico”, também para documentar um trânsito de Vênus. As placas de Todd foram guardadas e esquecidas.

Em 2002, o astrônomo Anthony Misch, do Obervatório Lick, encontrou as 147 placas feitas por Todd, e, com a ajuda de William Sheehan, transformou-as em imagens digitais que foram postas em movimento através da tecnologia QuickTime, hoje tão comum para divulgar imagens pela Internet. O resultado pode ser visto no saite da revista “Sky and Telescope”, em: http://skyandtelescope.com/observing/objects/sun/graphics/Transit1882Todd640.mov . São apenas quinze segundos, e tudo que vemos é um pequeno círculo negro cruzando um enorme círculo branco. Mas é, como lembra Misch, um fenômeno que ocorreu quando a Rainha Vitória governava a Grã-Bretanha, o presidente dos EUA era Chester Arthur (e, ouso acrescentar, D. Pedro II era nosso imperador). Um filme feito através de um abismo de 120 anos; uma obra que só existe pela paciente parceria de indivíduos que nunca se conheceram. É Arte? Não, não é. Mas é beleza pura.



Em tempo: O novo link para obter a animação em QuickTime é:

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