(Ela, "a Marquesa")
Ser mãe é ter na parede um quadro com a foto do Padre Cícero e enfiar na moldura, num ritual protetor, dezenas de retratos 3x4 de pessoas conhecidas, parentes ou não, crentes ou não.
Ser mãe é gostar de escutar Agostinho dos Santos, Capiba,
Dalva de Oliveira, Nelson Gonçalves, Roberto Carlos, Gal Costa, Altemar Dutra.
Ser mãe é botar água-pra-café no fogo às duas da manhã.
Ser mãe é ler escondido as cartas que o filho recebe das
namoradas e dias depois abordar um assunto qualquer como se aquilo tivesse
caído do céu no seu colo.
Ser mãe é dizer pro malcriado: “Ah, tá prendendo o choro? Pois vai
apanhar até chorar”, e dizer depois: “Agora vai apanhar até parar”.
Ser mãe é contar a história de quando era garota na
fazenda, e a porteira do curral caiu por cima dela enterrando-a na lama, e as
vacas passaram por cima, e quando arrancaram a porteira e a tiraram dali ela
estava inteira e viva, mas passou uma semana tirando terra do caroço do olho.
Ser mãe é receber um poema pelo correio e responder em
versos.
Ser mãe é gostar de ler romances de capa-e-espada de
Michel Zevaco, e livros sobre discos voadores, os Exilados de Capela e a vida
no planeta Marte.
Ser mãe é iniciar a noite com um olho na novela e outro
na sopa no fogão.
Ser mãe é passar alguns anos da vida rodando de ônibus
por cidades pequenas do Nordeste vendendo e doando botijões de uma infusão
vegetal que é tiro-e-queda contra o câncer.
Ser mãe é perder uma hora antes de ir dormir amarrando um
pano com Neocid no cabelo de um sujeito que se recusa a cortá-lo porque o
cabelo faz parte da revolução mundial.
Ser mãe é ganhar de presente uma garrafa de Ballantine,
agradecer, guardar no armário de bebidas, e ir lá dentro tomar uma dose de Natu
Nobilis.
Ser mãe é repetir uma recomendação qualquer nunca menos
de três ou quatro vezes, não importa quantas vezes o resignado interlocutor
diga: “Sim, eu já sei”.
Ser mãe é saber preparar orelha-de-pau, doce de leite com
cravo, imbuzada, gemada com farinha e açúcar, pão torrado com nata.
Ser mãe é ir pro Céu e não voltar pra puxar o pé do
filho ateu durante o sono (conforme ameaçado), porque o bichinho está tão
cansado, passou a noite escrevendo aquelas coisas que só ele entende.
Um comentário:
Essa Mãe aí também tive o prazer de conhecer! Saudades, D. Cleuza!
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