terça-feira, 4 de janeiro de 2011
2444) Uma noite em 67 (4.1.2011)
Assisti finalmente o documentário Uma Noite em 67 de Renato Terra e Ricardo Calil, que reconstitui a noite da grande final do Festival da Música Brasileira da TV Record. Misturando material de arquivo e entrevistas atuais, o filme pede aos artistas vencedores e derrotados, além de críticos e organizadores, que relembrem e comentem aquela época. Fazer filme assim é um dos muitos ovos-de-Colombo à disposição de documentaristas. O material de arquivo é farto (pelo que eu soube, tudo pertence á TV Record, então basta consultar um único arquivo em ver de fazer uma via-crucis de dezenas deles). Os entrevistados estão todos aí, acessíveis. E se o fato enfocado for de fato interessante, é só editar bem o material e correr pro abraço.
O Festival de 67 foi chamado o “festival da virada”, acho que porque marcou o surgimento do Tropicalismo como uma força musical, ainda meio sem forma e sem manifesto, uma espécie de dissidência pop da MPB. Isto ficou bem claro na premiação final. O primeiro e o terceiro prêmios foram para duas revelações da MPB tradicional, Edu Lobo (campeão com “Ponteio”, em parceria com Capinam) e Chico Buarque (“Roda Viva”). Ambos tinham ganho festivais recentemente (Edu com “Arrastão”, Chico com “A Banda”), então apesar de jovens já podiam ser considerados concorrentes pesos-pesados. O 2º. e o 4º. lugares foram para os tropicalistas: Gilberto Gil com “Domingo no Parque” e Caetano Veloso com “Alegria, Alegria”. Ficou explícito então o racha entre a música que recorria a fontes brasileiras tradicionais, principalmente o samba e outros ritmos regionais, e a música que assimilava influência do rock, da música pop internacional e de outras formas de linguagem (quadrinhos, cinema, etc.).
O filme é uma ótima Sessão Nostalgia para os que, como eu, acompanharam aquele festival pela TV, torcendo muito e sem saber direito por quem torcer. A rejeição ao Tropicalismo foi muito forte em alguns setores. Eu mesmo durante algum tempo martelei na tecla de que eles imitavam demais os Beatles, só depois reconheci o quanto havia ali de talento e originalidade. A oposição entre violão e guitarra era uma falsa oposição, uma metonímia mal colocada em que para rejeitar o todo (a invasão do lixo musical norte-americano) era preciso rejeitar uma parte (o uso de um instrumento elétrico).
Hoje já se sabe que o Tropicalismo venceu, e que sua vitória não eliminou o samba, a música rural, a canção regional e acústica. O estilo Tropicalista de se apresentar (guitarra, roupas exóticas, atitudes performáticas, modelos americanizados) virou um novo padrão. Algo parecido ocorreu com o tropicalíssimo programa de Chacrinha, que era transgressivo em seu tempo e hoje virou uma nova norma, sendo diluído e palidamente copiado por Faustão, Luciano Huck e todos os demais. Um padrão foi substituído por outro. O Sistema que assimila tudo assimilou o Tropicalismo, e os verdadeiros tropicalistas foram fazer outra coisa.
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2 comentários:
...dialética na vida cotidiana...
Anotei a dica e vou atrás pra assistir. Valeu, Braulio!
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